No caso dos social-democratas, percebe-se essa preocupação, porque uma vitória seria a última possibilidade de Manuela Ferreira Leite se manter na liderança. À hora a que escrevo, a direcção social-democrata reclamava essa vitória, com base numa vantagem do número de mandatos.
A direcção do PS pretendia, por seu lado, reduzir esse efeito de vitória quantitativa e valorizava a qualidade de algumas das vitórias, em municípios importantes - casos de Beja e Leiria, e a reconquista da Figueira da Foz que, no tempo de Mário Soares, era o maior concelho do socialista. Mas nenhuma destas estratégias resultou.
O problema é também do Partido Comunista que, através da sua CDU, não tem grandes motivos para proclamar vitória, apesar de manter resultados apreciáveis, sobretudo na península de Setúbal. E conseguiu recuperar três câmaras que já dirigiu – Alvito, Crato e Alpiarça. Mas perdeu três, entre elas a de Beja. E o Bloco de Esquerda voltou a mostrar que não é um partido autárquico, perdendo mesmo o mandato que tinha alcançado em Lisboa há quatro anos e confirmado há dois. Manteve, apesar de tudo, a presidência em Salvaterra de Magos.
Com os partidos em baixa, é de salientar que as candidaturas independentes, de um modo geral, também não conseguiram boas votações, embora geralmente sejam animadas por um populismo insuportável. É o caso de Isaltino Morais, em Oeiras, que esmagou a concorrência, mas sem chegar à maioria absoluta. Um resultado que deixou a candidata do PSD, Isabel Meireles, na casa dos 16 por cento. Mas o PS tem muitas lições a retirar, porque com a direita dividida Marcos Perestrelo ficou longe dos 30 por cento.
Em Gondomar, Valentim Loureiro, o maior dos populistas, repetiu a vitória, mas, tal como Isaltino, perdendo a maioria absoluta. Só Fátima Felgueiras foi derrotada, mas por uma coligação de direita. Noutro plano, merece destaque a boa votação do ex-PS, Narciso Miranda que, como independente, não conseguiu evitar a vitória clara de Guilherme Pinto. Mas conseguiu uma votação fortíssima, acima dos 30 por cento.
O PS teve ainda uma noite amarga, com a derrota das duas "duplas candidatas", Elisa Ferreira, no Porto, e Ana Gomes, em Sintra. Nenhuma das duas deputadas europeias conseguiu, sequer, retirar a maioria absoluta a Rui Rio e Fernando Seara. E as coisas também correram mal em Faro, onde cerca de 130 votos serviram para a Câmara mudar de mãos, ficando a partir daqui confiada a Macário Correia, do PSD. Uma derrota atenuada pela vitória socialista em Tavira, autarquia que Macário abandonou para se candidatar à principal câmara do Algarve.
Uma qualquer leitura nacional é também prejudicada pelo facto de os dois partidos de direita, CDS e PSD se terem apresentado coligados. Em 13 desses concelhos, a coligação saiu vencedora, mas perdeu a mais importante câmara do país, a de Lisboa. Santana Lopes chegou a ameaçar António Costa, tanto em percentagem como em número de mandatos.
Quando faltavam apurar 10 freguesias, Costa tinha uma vantagem percentual de 2.4, mas em mandatos, as duas coligações estavam empatadas - três vereadores para cada uma. Este facto provocou o adiamento da declaração dos dois líderes partidários. À meia-noite, nem José Sócrates nem Manuela Ferreira Leite tinham falado. A mais aguardada era a presidente do PSD e percebe-se porquê. Uma vitória de Santana Lopes podia adiar a sua demissão da liderança do partido, embora a questão estivesse agendada para o Conselho Nacional, marcado para a noite de ontem, terça-feira. Feitas as contas e como o bloco desapareceu, Costa conseguiu a maioria absoluta, apesar de uma vitória apertada, só confirmada sobre a meta.
Os próximos dias vão ser de ressaca, sobretudo, no PSD. Pedro Passos Coelho pede um debate interno, mas o presidente da Câmara de Gaia, Luís Filipe Menezes, vai mais longe e exige a demissão da líder. Ele foi um dos vencedores da noite e aproveitou esse facto para dizer que Manuela Ferreira Leite não consegue liderar a oposição.
José Sócrates já pode deixar de pensar nas autárquicas, para se dedicar à formação do novo Governo, para o que já foi indigitado pelo Presidente da República. Ele prometeu iniciar os contactos com os outros partidos ainda esta semana, mas sem adiantar o que lhes vai dizer. O momento é bom, porque o Bloco de Esquerda perdeu um pouco do gás conseguido nas legislativas, tal como o CDS. O PSD não terá um interlocutor forte, porque ninguém tem a certeza que Ferreira Leite resista ao Conselho Nacional da noite passada. O PCP, sempre igual a si próprio, conta pouco neste campeonato.
Sérgio Ferreira Borges*,
analista político
(o* autor assina a crónica "Avenida da Liberdade" publicada semanalmente no jornal CONTACTO)
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