Uma campanha audiovisual contra o estigma e o preconceito no Brasil foi lançada esta semana pelas Nações Unidas (ONU) para levantar naquele país o debate dos direitos humanos de estudantes, homossexuais, população negra, seropositivos, refugiados e profissionais do sexo.
A campanha “Igual a você” integra 10 filmes de 30 segundos que serão veiculados a partir de parcerias com televisões públicas, educativas e privadas no Brasil, até Junho de 2010. Com legendas em inglês e espanhol, ela poderá estender-se a outros países.
“Há países que nem o debate existe, seria uma forma de estimular países a debaterem a questões dos direitos humanos, países de língua portuguesa dada a proximidade”, sugere o coordenador do UNAIDS no Brasil, Pedro Chequer.
Segundo Chequer, o escritório do UNAIDS “é referência” para países de língua portuguesa. “Nós podemos mobilizar na CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) e fazer com que os países possam tomar como alternativa a promoção de direitos humanos e também no combate à sida.”
O coordenador da agência da ONU para o combate ao HIV/SIDA avançou ainda que a CPLP está a fechar um acordo com a ONU até Janeiro do ano que vem no sentido de “construir uma agenda de direitos humanos, prevenção e tratamento com vistas no acesso universal”.
“A CPLP está muito motivada, vemos a perspectiva bastante interessante nesse processo de intercâmbio do Brasil e dos países entre si”, referiu.
Os filmes da campanha apresentam mensagens de lideranças de grupos discriminados, levando em consideração as diversidades, raça, idade, cor e etnia.
Segundo um comunicado divulgado pelas Nações Unidas, na semana seguinte à visita ao Brasil da Alta Comissária para os Direitos Humanos, Navi Pillay, a campanha surge como uma “iniciativa contra as violações de direitos humanos e desigualdades” nas áreas de saúde, educação, emprego, segurança e convivência.
População negra ainda sofre com preconceito no país
O Brasil está “muito atrasado” na questão dos direitos da população negra que ainda sofre com preconceito no país, disse à Lusa a vice-directora do Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (Unifem), Júnia Puglia.
“Estamos atrasadíssimos com uma agenda enorme pela frente. O Brasil demorou muito para reconhecer a contribuição essencial da população africana para a construção do país e a necessidade de tratar as pessoas de forma igual”, afirmou.
Ao referir o Brasil como o último país do mundo a abolir a escravatura, há pouco mais de 100 anos, Puglia ressalta que ainda há “reflexos brutais” do passado escravocrata sobre a sociedade.
A representante da ONU falou à margem do lançamento da campanha audiovisual contra o estigma e o preconceito no país. “O que é preciso é trabalhar para construir uma outra forma de nos relacionarmos entre nós através da mudança cultural que é essencial”, salientou.
Júnia Puglia aponta ainda para a necessidade de deixar de lado o peso da história. “Depois de séculos de cegueira a população brasileira está a ser obrigada a se ver como realmente é, uma mistura”.
A história da população negra no Brasil é “muito triste”, comenta. “É uma história de sofrimento, dor e humilhação, mas temos tudo para transformar isso em outra coisa.”
O sistema educacional, como aponta a ONU, “ainda se constitui uma esfera marcada por fortíssimas desigualdades no acesso e na permanência dos indivíduos dos diferentes grupos populacionais”.
Os negros e negras estão menos presentes nas escolas, apresentam médias de anos de estudo inferiores e taxas de analfabetismo “bastante superiores”, informa um comunicado da ONU.
“As desigualdades se ampliam quanto maior o nível de ensino. A população negra, que, por se encontrar nos estratos de menor renda, é mais cedo pressionada a abandonar os estudos e ingressar no mercado de trabalho”, destaca o documento.
Segundo Puglia, os números indicam que a população negra ocupa os postos menos remunerados, tem muito mais dificuldade de alcançar níveis elevados de profissão e que existe ainda um tratamento discriminatório também no serviço de saúde.
“Por exemplo, as gestantes negras recebem menos atenção e um tratamento secundário nos hospitais”, critica.
Texto: Lusa/Foto: JLC
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