domingo, 22 de novembro de 2009

Crónica luxemburguesa: "Muhlenbach" - as sete fontes do moinho do riacho

Quando (Wann) hoje passamos por Muhlenbach (Millebach; Millen = moinho; Baach = riacho) é (ass) difícil (schwéier) imaginar o que foi aquele (deen) vale da capital em tempos mais recuados.

No local onde (wou) hoje se encontram as instalações da fábrica de faianças Villeroy & Boch existia um moinho (eng Millen) que acabou por dar (ginn) o nome (Numm) ao bairro que hoje conhecemos (kennen) .

Conta a lenda que a certa altura o caudal do riacho era tão fraco que o moinho estava parado uma grande parte do tempo, ocasionando assim grandes dificuldades ao pobre (aarm) moleiro que ali vivia com a mulher (Fra) , a filha (Duechter) e um aprendiz (Léierjong) .

Maria, filha única (eenzeg) do moleiro, bonita (schéin) e esperta, apaixonou-se pelo jovem moleirinho. Ele, rapaz inteligente e atractivo, a quem chamavam Blondin, concerteza (ganz bestëmmt) devido à sua cabeleira farta e loura, também (och) se apercebeu que a filha do seu mestre (Meeschter) não lhe era nada (guer net) indiferente... Assim, quando ela fez 18 anos (uechtzéng Joer) , Blondin pediu a mão da sua apaixonada ao moleiro. Só que, sem (ouni) outra (eng aner) explicação, o moleiro respondeu-lhe "sem (ouni) água (Wasser) e sem grão (Kär), o moinho pára". O pobre rapaz, embora esperto para o ofício (Beruff) , não entendeu o que o moleiro quis dizer e alguns tempos mais tarde voltou a pedir (froen) a menina (d’Meedchen) em casamento. Mas, a resposta (d’Äntwert) do moleiro de Millebach foi, mais uma vez (nach eng Kéier) , exactamente (genau), a mesma (d’selwecht) , e o pobre Blondin ficou sem saber o que o patrão queria (wollt) dizer (soen) com aquela frase (Saz) .

Se bem que a resposta não desse a entender uma aceitação do pedido de casamento, também não lhe parecia que se tratasse de uma recusa sem apelo. Aliás, como poderia tal acontecer? Era jovem (jonk) , belo, bem feito, honesto (éierlech) , não tinha defeitos de maior, tirando unicamente o facto de ser pobre, tão pobre como o pobre do seu patrão. Ora isso não podia ser uma razão para lhe recusar a mão (d’Hand) da filha. E, além do mais, o mestre-moleiro continuava a depositar-lhe inteira confiança, parecendo mesmo que tinha por ele uma certa afeição. Não encontrando explicação exacta para aquela recusa, decidiu ir consultar uma bruxa (Hex) contando-lhe o que pretendia e explicando a resposta que lhe tinha sido dada.

"Fácil (einfach) , respondeu a bruxa, o que o moleiro quer (wëllt) dizer é que sem água, não há hipótese de fazer mover o moinho nem de ganhar (verdéngen) dinheiro (Suen) para sustentar a família (d’Famill) e, não havendo água, os lavradores (d’Baueren) não trazem nem trigo (de Weess) nem milho (Mais) para moer (muelen) . Se (Wann) tu queres casar (bestueden) com Maria, tens de provar que a podes sustentar e que para isso és capaz de fazer chegar mais água ao riacho que faz funcionar o moinho". Como o rapaz (de Jong) não sabia (wousst net) muito bem (ganz gutt) como resolver a situação, logo a bruxa lhe propôs os serviços de um mágico que o podia (konnt) ajudar (hëllefen) – só era preciso que ele voltasse à meia-noite (Mëtternuecht) com um galo (en Hunn) preto (schwaarz) . E foi assim que o moleirinho lá foi ao encontro marcado. Só que logo se apercebeu que o dito mágico era, nem mais (net méi) nem menos (net manner) , que o diabo (den Däiwel) disfarçado. E, como em todas as histórias, o maligno quis fazer negócio em seu próprio (eegen) proveito. Ao princípio (am Ufank), o rapaz não quis ceder, mas, como estava tão apaixonado pela Maria Moleirinha, acabou por aceitar o que Satanás lhe propunha, isto é (dat heescht) , desviar para ali as águas que os ferreiros de Beaufort (Befert) utilizavam para fabricar as armas (Waffen) dos soldados (Zaldoten) . E (an) foi assim (et wor esou) que lhe prometeu reconhecimento eterno e a consagração do seu (vu sengem) primeiro (éischten) filho. No dia a seguir (duerno) , a água jorrou de sete (siwen) grandes tubos que apareceram a montante do moinho, ficando este logo prontinho a funcionar. A notícia (d’Neiegkeet) correu veloz (schnell) e de toda a parte veio gente carregada de sacos e sacos de cereais (Fruucht) para moer. Mais tarde (méi spéit) , soube-se que em Beaufort já não se faziam armas de qualquer espécie porque o riacho de lá tinha secado.

Quanto ao nosso moleirinho, inteligente como era, não quis de forma alguma manter a promessa feita ao diabo – o amor (d’Léift) que tinha por Maria, esse sim, era eternamente puro e não podia de forma alguma enviar os seus filhos para o Inferno (an d’Häll) . Deste modo, vendo assegurado o futuro (d’Zukunft) da sua amada, decidiu ficar solteiro (Jonggesell) e partiu, contente, para terras longínquas em busca de trabalho (Aarbecht) . E é assim que aquele sítio, ali (do) em Muhlenbach (op der Millebach) passou a chamar-se Sete Fontes (Septfontaines = Siwebueren) . Afinal, o moleirinho foi mais esperto do que o diabo!

Maria Januário
(Rubrica de civilização, cultura e língua luxemburguesas, publicada na segunda e na quarta semana de cada mês na edição papel do jornal CONTACTO)

Sem comentários:

Enviar um comentário