sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Crónica: Domingo se saberá... ou não!

Apenas uma sondagem, da Universidade Católica, aponta para uma vitória clara, embora escassa do Partido Socialista, nas eleições do próximo domingo. Todas as outras dão vantagem aos socialistas, embora numa situação de empate técnico.

Isto quer dizer que, no próximo domingo, a vitória pode ser determinada pelo sistema de fotofinish, o que equivale a dizer que será preciso contar o último voto, para saber quem de facto venceu.

Depois do fracasso das sondagens nas últimas eleições europeias, existe em Portugal, um clima generalizado de desconfianças, em relação aos estudos de opinião. Mas os técnicos eleitorais apontam para a possibilidade de surgirem resultados pouco esclarecidos e pouco esclarecedores. Por exemplo, dependendo a concentração de voto por círculos eleitorais, pode acontecer que o partido mais votado eleja um número de deputados inferior ao do segundo partido.

Outra possibilidade que está a ser considerada, esta muito mais real, pode passar por uma vitória do PSD, por maioria simples que deixava o sistema bloqueado. Explicando, o PSD, mesmo com uma coligação com o CDS, podia ficar muito longe dos 50 por cento de mandatos. Logo, a "maioria absoluta" do parlamento ficaria dividida pelos três partidos de esquerda, PS, Bloco de Esquerda e PCP, um cenário que tornaria a governação social-democrata, praticamente impossível, apesar de os socialistas, com toda a certeza, fazerem tudo para, no plano formal, não inviabilizarem o governo de Manuela Ferreira Leite. Mas o dia-a-dia político seria insustentável.

A verificar-se uma tal situação, o Presidente da República será fundamental. Por exemplo, insistirá com Manuela Ferreira Leite para ela formar governo? Ou dará a possibilidade ao PS de liderar uma maioria de esquerda que, formalmente, não ganhou as eleições? A Constituição permite as duas possibilidades e não só. Cavaco Silva tem a capacidade constitucional de sujeitar ao parlamento um governo de iniciativa presidencial, coisa em que ninguém acredita. E pode também dissolver o parlamento de imediato e convocar novas eleições, correndo aqui o risco de se repetirem resultados equívocos.

Há semanas escrevi aqui que estas eleições podem produzir resultados que serão um bom tema de estudo, para a ciência política. E esta é uma questão que põe, desde logo em causa, o sistema eleitoral. É uma reforma urgente, mas que vem sendo constantemente adiada, nos últimos 25 anos. A tal ponto que os partidos, que mantêm o monopólio da intervenção eleitoral para a Assembleia da República, deixaram de falar no assunto.

Neste clima, os partidos mais pequenos, à esquerda e à direita, parecem conformados com as conquistas de votantes conseguidas, mas preocupados com outra questão – a do voto útil. A bipolarização inevitável desta última semana de campanha pode provocar pequenas deslocações de voto dos mais pequenos, para os dois partidos do centrão, PS e PSD. No CDS, nota-se alguma instabilidade das intenções de voto, o que pode significar que eleitores inseguros, com a crescente dramatização da campanha, possam acabar por votar no PSD. À esquerda, o fenómeno é semelhante. O Partido Comunista tem baixado ligeiramente nas intenções de voto e o Bloco de Esquerda, sempre com boas quotas, tem sondagens que o colocam entre os 17 e os 12 por cento, portanto, com uma margem de flutuação muito grande, pode mesmo dizer-se enorme e só vista em forças que geralmente se cotam acima dos 30 por cento.

Do lado esquerdo do espectro, apareceram, no último fim de semana, declarações que podem indiciar uma possibilidade de entendimento, entre o PS e o Bloco de Esquerda. Mário Soares esteve num comício socialista em Matosinhos e, à margem, disse aos jornalistas que não se escandalizaria, com um entendimento entre socialistas e bloquistas. Francisco Loução foi confrontado com esta declaração e disse que não havia qualquer possibilidade de entendimento, sobretudo, depois de o PS ter feito o Código de Trabalho que está hoje em vigor. Mas no seu discurso, introduziu uma nuance, mal explicada: "a esquerda possível". A expressão é suficientemente ambígua, podendo por isso evoluir para um conceito de convergência parlamentar que permita um governo de "esquerda possível", isto é, um governo do PS, com o apoio parlamentar pontual, do Bloco de Esquerda.

Sérgio Ferreira Borges,
analista político

(o autor assina semanalmente a crónica política "Avenida da Liberdade" no jornal CONTACTO)

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