Um recenseamento caduco, um sistema de voto inadequado e falta de interesse pelas comunidades portuguesas são os argumentos dos portugueses no estrangeiro para justificar a abstenção nas legislativas de 84,75 por cento nos círculos da emigração.
"Tem de se encontrar uma solução para facilitar a inscrição e a forma de votar", defendeu hoje o presidente da Confederação da Comunidade Portuguesa no Luxemburgo (CCPL), Coimbra de Matos.
A abstenção nas últimas eleições legislativas nos círculos da emigração atingiu 84,75 por cento, tendo votado apenas 25.472 dos 167.007 eleitores inscritos, de acordo com a Direcção-Geral da Administração Interna (DGAI).
Dos quatro deputados em causa nos dois círculos da emigração, o PSD elegeu José Cesário e Carlos Páscoa Gonçalves pelo círculo Fora da Europa (com um total de 4736 votos) e Carlos Gonçalves pelo da Europa (7219 votos). O PS elegeu Paulo Pisco pela Europa (3970 votos).
Contactado pela Agência Lusa, Coimbra de Matos apontou o "reduzido" número de inscritos nos cadernos eleitorais no Luxemburgo como uma das causas da abstenção e defendeu que "as pessoas deviam ser obrigadas a recensearem-se, tal e qual como em Portugal".
Quanto ao método de voto, o presidente da CCPL referiu as constantes queixas de pessoas que não recebem o voto por correspondência para afirmar que "na Europa justifica-se o voto presencial".
Para Coimbra de Matos, também os partidos políticos deviam investir mais nas comunidades e recrutar para as suas listas portugueses que "residam no estrangeiro e que conheçam a realidade".
Também Hermano Sanches Ruivo, conselheiro na Câmara de Paris, considera que Portugal investe pouco nas comunidades portuguesas, o que desmotiva os emigrantes na hora de votar.
"Os portugueses no estrangeiro estão demasiado longe da informação, da atenção e da disponibilidade dos deputados e dos partidos políticos, o que faz com que o interesse não seja muito", disse à Lusa.
Para o luso-descendente, "se houvesse mais trabalho dos partidos havia mais pessoas a votar".
Hermano Sanches Ruivo considera ainda que a "única solução" para promover a participação cívica dos portugueses no estrangeiro é o voto electrónico.
Com apenas cerca de 1.600 portugueses a votar na Suíça, o conselheiro Manuel Beja sublinhou que "mais uma vez se prova que a abstenção está relacionada com o desinteresse que Portugal mostra com comunidades e com processo de recenseamento".
"Portugal esquece-se que existem comunidades, o que também desmotiva a participação cívica. O processo de recenseamento está ultrapassado e precisa de ser revisto", defendeu.
Para Manuel Beja, o combate à abstenção tem de ser feito com a "solidificação do processo de recenseamento e uma maior abertura de Portugal às comunidades, com iniciativas que incentivem o eleitorado".
O conselheiro das Comunidades Portuguesas no Brasil, Ângelo Leite Horto, também considera o reduzido número de portugueses recenseados como o grande responsável pela abstenção.
"Muitos portugueses não estão recenseados porque a maioria não vai ao consulado só para se recensear", disse.
Para este conselheiro, só quando começarem a ser emitidos os cartões do cidadão no estrangeiro, que permite o recenseamento automático, é que essa situação ficará resolvida.
Outra questão apontada por Ângelo Leite Horto é que "muitas pessoas não têm informação do que está a acontecer a nível das eleições em Portugal" e outras tantas consideram que "não vale a pena votar, porque não vai resolver nada".
A elevada abstenção também não surpreendeu a comunidade lusa radicada na Venezuela, que insiste em responsabilizar os correios locais pela não entrega atempada dos boletins de voto.
"Temo-nos queixado que o funcionamento dos correios não é o ideal. Há correspondência que mesmo dentro da cidade demora mais de um mês a ser entregue e por isso as pessoas recorrem a empresas privadas", disse Manuel Ascenção à Lusa.
Este sócio do Centro Português de Caracas diz que "não ficou nada surpreendido(com a elevada abstenção)"."Surpresa é o facto dos políticos não procurarem alternativas", frisou.
Por seu turno, a secção regional do Conselho das Comunidades Portuguesas defendeu a necessidade de mudar o sistema de voto por correspondência.
"O sistema (de voto por correspondência) não funciona. Há pessoas que ainda hoje não receberam os boletins e muitas só os receberam depois da data das eleições" disse o conselheiro Luis Jorge à Lusa.
"Inclusive o PSD, que se opôs a mudanças no sistema de votação, deu-se conta de que não funciona", destacou.
O conselheiro adiantou que as pessoas estão preocupadas por não terem votado, pois se isso acontecer duas vezes são eliminadas do registo eleitoral.
"Perdeu-se o trabalho dos consulados para motivar as pessoas a recensearem-se", disse, acrescentando que, em Agosto último, dos mais de 11.000 recenseados a Comissão Nacional de Eleições apenas reconhecia 6.000 dos quais só 3.000 foram considerados habilitados a votar".
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