quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Quem tem medo dos testes de Luxemburguês?

Diz que só conhece uma palavra em Luxemburguês: "Amen". O padre Belmiro Narino, um dos 981 portugueses que se naturalizaram este ano, não precisou de fazer o teste de língua para obter a nacionalidade luxemburguesa. Chegou ao país em 1977, e a lei dispensa do temido exame os que vivem no Grão-Ducado desde 1984, ano em que o Luxemburguês se tornou língua oficial.

Obter a nacionalidade luxemburguesa foi "a única maneira de [se] sentir cidadão" e de poder exercer o direito de voto nas legislativas, e é claramente um momento alto na vida do provedor da Santa Casa da Misericórdia no Luxemburgo, que aos 78 realizou um sonho no país que lhe deu "a possibilidade de ser livre, como padre e como pessoa". Mas se tivesse de estudar Luxemburguês e fazer o teste, jamais pediria a naturalização.

"Não o faria, porque quando eu cá cheguei até os luxemburgueses diziam que não valia a pena aprender o Luxemburguês, e agora não o faria".

Não está sozinho: entre Janeiro e Julho deste ano, só vinte portugueses fizeram o teste de Luxemburguês para obter a dupla nacionalidade, segundo dados do Ministério da Justiça. Duas dezenas de testes em 1.405 pedidos de naturalização são uma gota no oceano: só em 1,4 % dos casos os portugueses que não estão abrangidos pela dispensa de exame pediram a naturalização.

A "grande maioria dos pedidos de naturalização são de jovens que beneficiam da cláusula que os dispensa do exame, por terem frequentado a escolaridade obrigatória no país durante sete anos", disse ao CONTACTO Jean-Laurent Redondo, responsável do Serviço da Nacionalidade.

Natália Silva(1) é um desses casos. Tem 33 anos, nasceu no Grão-Ducado, mas só decidiu fazer o pedido de naturalização em Junho, "porque antes a lei obrigava a renunciar à nacionalidade portuguesa, e isso eu não queria". Como fez a escolaridade obrigatória cá, não precisou de fazer teste de Luxemburguês, que fala fluentemente. Mas o marido, também português, é um dos que não vai pedir a nacionalidade luxemburguesa por causa do exame. Apesar de também ter nascido no Luxemburgo, António, de 33 anos, voltou para Portugal com seis. Regressou ao Grão-Ducado com os pais quando tinha 13 anos, mas nunca se sentiu confortável com o idioma caro aos luxemburgueses, apesar de ser quase fluente.

"Falamos Luxemburguês em casa, com as miúdas", diz Natália, que tem duas filhas com três e seis anos, "e ele fala Luxemburguês connosco, mas só connosco. Tem uma pronúncia muito forte, e tem vergonha de falar. Eu acho que ele passava o teste, mas ele tem medo", explica.

APRENDER LUXEMBURGUÊS
LEVA TEMPO

Aprender Luxemburguês em adulto é um processo moroso. João(1) , 33 anos, vive no Grão-Ducado há 11 e gostava de obter a nacionalidade luxemburguesa "para [se] sentir mais integrado e poder ser mais bem aceite" no país. Mas apesar de frequentar um curso de Luxemburguês há cinco anos e de falar o idioma no trabalho, ainda não se sente preparado para enfrentar o teste.

"Não tenho confiança em mim e nos meus conhecimentos de Luxemburguês, embora a professora me tivesse dito que podia fazer o exame. Tenho nível de expressão corrente, um Luxemburguês de nível básico – que me permite ir às compras, ir a um médico, falar com um Luxemburguês –, mas não gosto de falhar nada e não quis falhar no teste", contou ao CONTACTO.

A avaliar pelo reduzido número de candidatos portugueses às provas de Luxemburguês, o exame é a maior barreira para obter a dupla nacionalidade, e pode funcionar como factor dissuasor.

Para José Coimbra de Matos, presidente da Confederação da Comunidade Portuguesa no Luxemburgo (CCPL), a lei foi feita para a segunda geração. Satisfeito com o elevado número de pedidos de naturalização vindos de portugueses, o dirigente associativo lamenta ainda assim que o teste deixe muitos de fora.

"É um número bastante importante nesta primeira fase, mas fica muito aquém dos potenciais interessados. A questão das exigências linguísticas deixa de fora um bom número de pessoas, nomeadamente aqueles que não dominam ao nível exigido a língua luxemburguesa".

O dirigente associativo, há 22 anos no Luxemburgo, lamenta fazer parte deste grupo. Se tivesse chegado dois anos mais cedo ao Grão-Ducado, "já seria luxemburguês".

"Eu que me bati pela dupla nacionalidade ao longo de vinte anos não tenho nível de Luxemburguês que me permita naturalizar-me, apesar de já ter feito três cursos de Luxemburguês, com certificados e tudo", conta.

"Sinto-me tão ou mais integrado do que alguns que o fizeram: participo activamente na vida social, cultural e política do Luxemburgo. O que prova que a exigência linguística é um factor de dissuasão para grande parte dos portugueses".

No exame de Luxemburguês, os candidatos à naturalização devem fazer prova de terem nível A2 na expressão oral e B1 na compreensão oral, segundo a classificação do Centro de Línguas, onde as provas são prestadas. Na prática, os candidatos devem ser capazes de perceber as notícias na rádio e de se exprimirem sobre eventos da sua vida quotidiana.

Estão dispensados do exame de Luxemburguês os imigrantes chegados ao país antes de 1984, data em que o idioma se tornou oficial, e ainda os que frequentaram sete anos de escolaridade obrigatória no Grão-Ducado.

Paula Telo Alves

Sem comentários:

Enviar um comentário