Os congressos do PSD continuam a ser um grande espectáculo televisivo, embora em constante perda de audiência. O deste fim-de-semana não foi diferente, mas deixou a sensação de que tudo não passou de um inócuo entretenimento político.
Alguns dos que lá estiveram podem ter ganho qualquer coisa para o seu futuro político mais ou menos imediato. Mas o País e o próprio partido não ganharam nada. E no entanto, houve pelo menos três bons discursos, os de Santana Lopes, Paulo Rangel e Marcelo Rebelo de Sousa.
Os dois primeiros tiveram, como linha comum, o ataque a José Sócrates. Paradoxalmente, serviram para provar que o PSD não criticou o primeiro-ministro como e quando devia, e fá-lo agora, quando o estado de graça se acabou há muito. Santana Lopes aproveitou ainda para dar algumas alfinetadas a Cavaco Silva, mostrando que não esqueceu a metáfora da moeda fraca e da moeda boa, que acabou por ser decisiva, na demissão do seu Governo. Fez a radiografia do País, preocupante, claro, para depois dizer que todos estes males não são imputáveis "aos quatro, mais quatro meses" da sua liderança. Obviamente, foi a catarse, com Santana Lopes a tentar passar a esponja pelo seu passado político recente, que não foi brilhante nem deixou saudades ao país, nem tão pouco ao PSD.
Paulo Rangel, candidato à liderança, teve outro bom discurso, centrando o ataque em José Sócrates e tentando ganhar o partido para a missão de se constituir como alternativa. Se vier a ser eleito e, portanto, futuro candidato a primeiro-ministro, já tem as linhas de força de actuação que, sem equívocos, povoaram o seu discurso em Mafra. E até foi notória a preocupação social de Paulo Rangel, marcando com isso alguma distância em relação ao liberalismo insano de Pedro Passos Coelho. Sem surpresa, Passos Coelho esteve infeliz, até nas gaffes . Uma delas levou mesmo Alberto João Jardim a manifestar de imediato o seu apoio a Paulo Rangel. Ele lidera todas as sondagens até hoje publicadas, mas Rangel tem crescido e está cada vez mais próximo. A vantagem de Passos Coelho está, sem dúvida, na plasticidade da imagem. Mas o discurso continua a ser fraco, inculto, repleto de banalidades que ele debita com o tom solene que só as grandes ideias merecem. E ele, manifestamente, não as tem.
O terceiro bom discurso foi o de Marcelo Rebelo de Sousa, mas também sem novidades. Em síntese, ele foi a Mafra dizer que, se o partido se apresentar aos portugueses como uma manta de retalhos, onde nem sempre se consegue escolher o melhor retalho, não conseguirá o estatuto de alternativa. Mas se sair deste processo coeso, então sim, pode vir regressar ao poder, num futuro muito próximo. Depois de ter andado a dizer repetidamente que só seria candidato num quadro de grande unidade partidária, é evidente que o seu discurso neste congresso, apesar dos quatro candidatos, não podia ser outro. E nalguns aspectos, parece até ter sido concertado com Pedro Santana Lopes.
Mas então o que faltou? Do meu ponto de vista, o congresso teria valido a pena e teria sido até muito útil, se tivesse ajudado a redefinir uma linha de rumo para o partido, que deixasse claro se vai continuar a defender acriticamente os interesses da direita mais egoísta, ou se, por outro lado, pretende voltar ao inter-classismo conservador de Sá Carneiro. E sobre a mesa estão dois baralhos que podem representar estas duas opções. A primeira tem Passos Coelho como protagonista, a segunda, Paulo Rangel.
Por isso, a desistência de José Pedro Aguiar-Branco seria clarificadora. Existe um quarto candidato sem qualquer expressão. Numa dinâmica bipolarizada, as eleições directas do dia 26 ajudariam a uma escolha mais clarificada, embora nenhum deles esteja imune ao neo-liberalismo. E Aguiar-Branco está a sofrer algumas pressões para desistir. As sondagens mostram que ele não tem qualquer possibilidade de vitória. Por isso, ao sair da corrida, podia contribuir para uma outra vitória, para o esclarecimento doutrinário do partido.
Não se trata aqui de encontrar uma salvação para o país, porque nenhum dos candidatos tem essa capacidade. Mas apenas de encontrar uma solução menos má.
E o país está a precisar, como atesta a crueldade dos números publicados pelo Instituto Nacional de Estatística. O suicídio é hoje a maior causa não natural de morte em Portugal. Em 2008, 1.035 portugueses escolheram a via do desespero. Os acidentes na estrada, que sempre lideraram este ranking , ficaram-se pelas 776 mortes. A eloquência dos números dispensa mais comentários.
Sérgio Ferreira Borges,
analista político
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