sábado, 5 de maio de 2012

"O 25 de Abril foi o despertar de um dia novo"

O padre Belmiro Narino, figura tutelar da comunidade portuguesa no Luxemburgo, foi o convidado da conferência inaugural de um ciclo de leituras-debates dirigido à comunidade portuguesa e lusófona, que teve lugar no dia 25 de Abril, na Livraria Libo, na cidade do Luxemburgo.

A data do debate e a decoração com cravos vermelhos na mesa faziam antever o tema da conversa, a Revolução dos Cravos.

José Luís Correia, chefe de redacção do CONTACTO, foi o moderador da sessão que, num ambiente de tertúlia, incluiu leituras de excertos do livro de crónicas do padre Belmiro Narino "O homem à beira do seu destino", publicado em 2009.

Partindo de textos do seu livro, o padre Belmiro comentou não só a censura do 25 de Abril como partilhou a experiência do exílio a que se viu forçado antes de 1974. "O 25 de Abril foi o despertar de um dia novo, para mim o dia nasceu duas vezes, era um tempo novo, chegava a liberdade".

Testemunha da censura da Revolução dos Cravos, constrangido a abandonar Portugal, regressou clandestinamente e, exilado na Embaixada francesa, "uma casa tão cúmplice como benevolente", foi autorizado a residir em Lisboa, mas proibido de ensinar Filosofia e de escrever.

"No dia 25 de Abril, faz hoje 38 anos, eram 8h, estava eu na Embaixada francesa e, pelas 11h, comecei a ouvir uns tiros e fiquei com medo", recorda. "Tudo se passava no Largo do Carmo, onde estava exilado o Marcelo Caetano". "Nesse instante, um colega meu francês, mais velho, virou-se e disse-me: não tenhas medo, isto na França foi muito pior durante a ocupação", concluiu com humor.

O conferencista conta alguns casos "anedóticos" a que assistiu após o 25 de Abril. "Há vários episódios que hoje me fazem rir. Por exemplo, houve bastante perturbação no tempo de Otelo", conta. "Uma vez os operários da Lisnave foram para Lisboa cercar o Palácio Foz, ocuparam o passeio, bloquearam-me a passagem e eu perguntei, não passou por aqui o 25 de Abril? É que é suposto o 25 de Abril permitir a liberdade de circulação das pessoas! E aí deixaram-me passar".

Sobre a realidade portuguesa actual, comenta: "As coisas não estão a melhorar porque o poder local está a imitar exactamente o que faz o poder central: não auscultam o povo, auscultam uns tantos que lhes garantem o futuro, mas falta ouvir a voz do Povo".

Este ciclo de debates resulta de uma parceria entre a Livraria Libo e o CONTACTO, e o calendário futuro será divulgado oportunamente aos nossos leitores.

O livro encontra-se à venda na Livraria Libo, e as receitas da venda da obra revertem a favor da Santa Casa da Misericórdia do Luxemburgo.

Natural do Fundão, o padre Belmiro Narino estudou na Guarda e depois licenciou-se em Filosofia pela Universidade Gregoriana de Roma. É sacerdote no Luxemburgo desde 1978 e dois anos depois começou a colaborar com o CONTACTO. Hoje é responsável pela Santa Casa da Misericórdia do Luxemburgo, que criou em 1996, e editorialista do nosso jornal. Colaborou em vários jornais e revistas portugueses, nomeadamente no Jornal do Fundão, antes de 1974.
Texto e foto: Patrícia Marques

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