Insistindo que "o Orçamento de Estado (OE) de 2010 é um orçamento anti-crise", o ministro das Finanças Luc Frieden avisou na semana passada perante a Câmara dos Deputados que "o Estado não é o São Nicolau nem o seguro contra todos os riscos". A partir de 2011, o Governo vai novamente "apertar o cinto" para reequilibrar as contas públicas até ao fim da legislatura (2014).
Ainda que os números exactos apenas sejam conhecidos em Março, Luc Frieden fez saber no seu discurso, ao qual o CONTACTO teve acesso, que o OE de 2009 deverá ter um défice de 3,5 %, estimando que irão faltar cerca de mil milhões de euros nos cofres do Estado, em parte devido à diminuição das receitas provenientes do IVA.
Já em 2010, o ministro das Finanças prevê que o défice seja de 4 %, valor que ultrapassa os 3 % autorizados pelo Pacto de Estabilidade europeu e bem abaixo dos 4,2 % de crescimento em 2002 e 6,5 % em 2007.
Apesar da conjuntura desfavorável, Luc Frieden garante que o plano para a retoma económica será mantido. A título de exemplo, as despesas para o fundo de desemprego passam de 380 milhões em 2008 para 580 milhões em 2010.
A despesa irá atingir no total os 19 % do produto interno bruto (PIB), ou seja, sete mil milhões de euros. Neste domínio, Frieden explica que valores entre os 10 % e 20 % são aceitáveis, mas que se deve a todo o custo evitar os 60 %, limite imposto por Bruxelas, porque o Luxemburgo nunca teria capacidade para reembolsar tamanha dívida.
O titular da pasta das Finanças avisa que em 2011 irão ocorrer "mudanças" com vista ao reequilibro das contas do erário público até ao final da legislatura.
Frieden aponta para três estratégias já mencionadas pelo primeiro-ministro Jean-Claude Juncker, nomeadamente, baixar as despesas de funcionamento do Estado, não aumentar sistematicamente os investimentos públicos de ano para ano e definir melhor o público-alvo das ajudas sociais.
"O Estado não é o São Nicolau nem o seguro contra todos os riscos", lança Frieden, acrescentando que "nem toda a reforma é sinónimo de desmantelamento social, sendo necessário haver coragem de discutir certas despesas e ver se estas podem ser melhoradas".
"Onde não haverá vontade de reformar, o Governo saberá tomar as suas responsabilidades e levar a cabo a discussão sem tabu e sem ideologia", prenuncia o ministro das Finanças.
"Bem-estar artificial"
Na véspera, também Lucien Thiel, relator do OE de 2010, alertava diante das bancadas parlamentares que a "política anticíclica levada a cabo pelo Governo e criadora de bem-estar artificial, atingiu o limite".
"A questão é saber quando é que iremos passar do acelerador para o travão, isto é, será ao mesmo tempo que os outros países, no decorrer do ano de 2010, um pouco mais cedo se seguirmos os europeus, um pouco mais tarde seguindo os americanos", pergunta Thiel.
"Não se pode fazer como se nada fosse", recomenda o cristão-social Lucien Thiel, dirigindo-se sobretudo aos sindicatos que não querem ouvir falar em redução de despesas por parte do Estado, temendo pelo desmantelamento social.
Para o deputado, a solução terá de irremediavelmente passar pela redução das despesas do Estado ou pelo aumento de impostos. Lucien Thiel sugere a combinação entre as duas soluções e propõe que se recorra somente à segunda caso a primeira não seja suficiente.
Thiel avisa que o aumento precipitado dos impostos contribuiria para a deslocalização das empresas.
Renovar a praça financeira
O relator do OE está convencido que "não haverá um regresso à normalidade depois da crise", devido ao facto de os constantes ataques contra o segredo bancário terem abalado a praça financeira do Luxemburgo, da qual dependem 25 % das receitas do Estado.
O próprio ministro das Finanças Luc Frieden anunciou na quinta-feira durante o banking day , organizado pela empresa de auditoria PricewaterHouseCoopers, que os bancários deviam preparar-se para abdicar totalmente do segredo bancário daqui a três ou quatro anos.
Um painel de especialistas presentes debruçou-se sobre as estratégias nas quais a banca luxemburguesa deverá apostar no futuro.
Doravante, os bancos privados do Grão-Ducado deverão apostar num alto grau de competências e de serviços para fazer a diferença, e, para tal, dotar-se de pessoal altamente qualificado.
Também ficou demonstrado que os perfis dos clientes se vão alterar. O cliente deixará de ser predominantemente francês, alemão ou belga, devendo-se apostar numa clientela mais internacional.
Um das estratégias que sobressaiu na mesa de propostas foi a de que o Luxemburgo deverá aproveitar o seu estatuto de Estado-membro da UE para servir de porta de entrada para a Europa aos investidores asiáticos.
Houve ainda quem referisse haver viabilidade com os países do Leste ou com Singapura, grande rival do Luxemburgo no que respeita à gestão de fortunas.
Nuno Costa
Foto: Guy Jallay
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