O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem condenou hoje o Luxemburgo
por violar a liberdade de expressão e o respeito à vida privada, dando
razão a uma queixa apresentada pelo jornal português Contacto, na
sequência de buscas policiais ao semanário.
Na origem das buscas,
realizadas em maio de 2009, esteve a reportagem "Vidas desfeitas à
ordem do tribunal", sobre o caso de dois menores portugueses cuja
custódia foi retirada às famílias.
O artigo, publicado em
dezembro de 2008, deu origem a uma queixa-crime apresentada pelos
serviços sociais luxemburgueses e pelo assistente social referido na
reportagem, que se queixavam de difamação do assistente e “do sistema
judicial e social luxemburguês”.
O semanário português era ainda
acusado de ter revelado indevidamente a identidade do menor protagonista
da reportagem, uma acusação que a direção do jornal sempre rejeitou,
alegando que a lei da proteção da juventude permite revelar a identidade
dos menores para defender os seus interesses.
A 07 de maio de
2009, dois polícias, acompanhados por um técnico em informática,
estiveram na redação do Contacto, de onde levaram um bloco com notas de
reportagem e cópia de um ficheiro de um computador.
O grupo
editorial Saint Paul, proprietário do jornal, apresentou queixa por
violação da proteção das fontes, prevista na lei de imprensa
luxemburguesa, mas os tribunais luxemburgueses não lhe deram razão.
O
proprietário do jornal decidiu então recorrer para o Tribunal Europeu
dos Direitos do Homem. Na ação proposta em abril de 2010, o grupo
editorial considerava que as buscas policiais violaram os artigos 8.º e
10.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que preveem a proteção
da vida privada e a liberdade de expressão.
Hoje, os juízes do
Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, sediado em Estrasburgo, deram
razão ao jornal, considerando por unanimidade que as buscas e a
apreensão foram “desproporcionadas” e violaram a liberdade de expressão.
O tribunal também considerou que as buscas violaram a proteção
da vida privada, por seis votos contra um, e condenou o Estado
luxemburguês a pagar uma indemnização de 5.635 euros ao proprietário do
jornal.
As buscas ao jornal português já tinham sido condenadas
pela organização Repórteres sem Fronteiras (RSF), pela Federação
Europeia de Jornalistas e o Conselho de Imprensa do Luxemburgo, levando o
país a descer 19 lugares no ranking da liberdade de imprensa publicado
anualmente pelos RSF.
Alguns meses depois de o jornal português
ter publicado a reportagem, o Tribunal da Juventude do Luxemburgo anulou
a sentença que ditava o internamento compulsivo de um dos menores num
internato na Bélgica, devolvendo a guarda da criança à família.
Na
sentença, a juíza não poupou críticas ao sistema de ensino no
Luxemburgo e aos técnicos da Segurança Social responsáveis pelo caso.
A
juíza considerou que a decisão de retirar o menor à família, uma medida
que qualificou de "extremamente grave e dolorosa", foi tomada pelo
Tribunal da Juventude e pelos serviços sociais luxemburgueses à revelia
das informações dadas pela psicóloga da criança e pelos pais, que a
juíza descreveu como cooperantes e preocupados com a situação do filho,
diagnosticado com hiperatividade.