terça-feira, 22 de maio de 2012

Jornal Público acusa ministro Miguel Relvas de pressão para não publicar artigo sobre as Secretas


O Conselho de Redação do Público denunciou na sexta-feira (dia 18) que o ministro dos Assuntos Parlamentares ameaçou com um "blackout" governamental sobre o jornal e a divulgação pública de dados pessoais de uma jornalista, por causa de uma notícia, que não foi publicada.

A denúncia, divulgada em comunicado, surgiu depois de a jornalista visada, Maria José Oliveira, ter pedido ao Conselho de Redacção (CR) que "analisasse uma série de episódios ocorridos na quarta-feira" (dia 16), em que o ministro "queixou-se ao jornal de estar a ser perseguido, ameaçando a jornalista e o Público se fosse publicada uma determinada notícia".

A notícia, que pretendia evidenciar "as incongruências" das declarações de Miguel Relvas, na terça-feira (dia 15), no Parlamento, sobre o caso das Secretas, não foi publicada, justificando a direcção do diário, numa nota, que "não havia matéria publicável", tendo a decisão sido tomada antes de conhecer as ameaças do ministro.

Segundo o comunicado do CR do Público, o ministro dos Assuntos Parlamentares, que tutela a Comunicação Social, "terá dito que, se o jornal publicasse a notícia, enviaria uma queixa" ao regulador, "promoveria um 'blackout' de todos os ministros em relação ao Público e divulgaria, na internet, dados da vida privada da jornalista".

As ameaças, que o CR considera "intoleráveis", foram feitas, de acordo com a mesma nota, num primeiro contacto telefónico à editora de Política do jornal e reiteradas num segundo telefonema.

O Conselho de Redacção entende que "existia relevância noticiosa no texto" de Maria José Oliveira e acusa o ministro de "tentar travar um órgão de comunicação social que cumpre o seu inalienável papel de contra-poder", mediante ameaças, "um acto essencialmente cobarde".

Os membros do CR consideram ainda que "o jornal falhou ao não repudiar imediata e publicamente a inaceitável atitude de pressão" de Miguel Relvas e prometem estudar o caso com o advogado do jornal e com o Sindicato dos Jornalistas, "para definir acções futuras junto das entidades competentes".

Confirmando a "pressão inaceitável" do ministro dos Assuntos Parlamentares, junto do qual a directora do Público, Bárbara Reis, "protestou", a direcção do jornal lembra que a sua conduta, "ao longo dos anos, tem sido a de não reagir ou denunciar publicamente as ameaças ou pressões feitas a jornalistas", a menos quando "existam violações da lei", o que não foi o caso, de acordo com o advogado do diário consultado, ressalva a nota.

A direcção do jornal relata que no dia seguinte à audição parlamentar de Miguel Relvas, a jornalista Maria José Oliveira enviou uma série de perguntas ao ministro sobre as declarações que proferiu, que já tinham sido noticiadas, às quais o titular não respondeu.

"A única informação nova em relação aos factos já conhecidos era que o ministro não aceitou responder. Por isso, a direcção entendeu que não havia matéria publicável", sustenta a mesma nota, acrescentando que "três editores e a directora" do jornal "decidiram que não havia notícia antes de saberem do telefonema" de Relvas.

A direcção do diário assegura que, "até hoje, nenhuma notícia sobre o caso das Secretas deixou de ser publicada e nenhum facto relevante sobre esta matéria deixou de ser do conhecimento dos leitores".


Relvas nega pressões

O gabinete do ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares repudiou no mesmo dia a denúncia do Conselho de Redacção do Público sobre ameaças de Miguel Relvas ao jornal e a uma jornalista.

Em comunicado, o gabinete do titular da pasta da Comunicação Social considera "totalmente destituídas de fundamento, repudiando-as categoricamente" as notícias atribuídas ao Conselho de Redacção do jornal, "envolvendo supostas ameaças ou pressões efectuadas pelo ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares em relação a algum membro do corpo redactorial". A nota acrescenta que "a decisão de publicar ou não uma determinada notícia compete exclusivamente aos membros da direcção editorial de um órgão de comunicação social".

Tal, conclui o gabinete de Miguel Relvas, "sem prejuízo de poderem ser accionados todos os meios legais para a defesa da honra e do bom nome" do ministro e "sem que em nenhum momento seja colocada em causa a liberdade de expressão e a liberdade de imprensa".

PS quer ouvir Relvas no Parlamento


O PS anunciou entretanto que vai pedir a presença do ministro Miguel Relvas no Parlamento para prestar esclarecimentos sobre as alegadas ameaças sobre o Público e uma jornalista do jornal.

O anúncio foi feito, em declarações à agência Lusa, pela deputada Inês Medeiros, depois de o Conselho de Redacção do Público ter denunciado, em comunicado, que Miguel Relvas ameaçou com um "blackout" governamental ao jornal, uma queixa ao regulador do setor e com a divulgação na Internet de dados da vida privada de uma jornalista do diário, se fosse publicada uma notícia.

Numa reacção à Lusa, a deputada Inês Medeiros considerou que "são acusações de extrema gravidade", sobretudo quando envolvem "ameaças de divulgação de dados da vida privada".

Para o PS, "não podem subsistir dúvidas", pelo que vai pedir a presença do ministro no Parlamento para "prestar os esclarecimentos necessários" e, se se justificar, a dos outros visados no caso.

A confirmarem-se as pressões, PCP e Sindicato de Jornalistas dizem que Relvas não tem condições para continuar no Governo

O PCP considerou no sábado que caso se confirmem as "alegadas pressões" de Miguel Relvas a uma jornalista do Público, o ministro "não tem condições para continuar a ser membro do Governo".

"A confirmarem-se estas alegadas pressões e perante uma acção deste tipo, um ministro não tem condições para continuar a ser membro de um Governo", afirmou o deputado do PCP Miguel Tiago, em declarações à Lusa. Sublinhando que antes de mais importa "clarificar o mais possível" o que aconteceu e confirmar as versões do Conselho de Redacção e da direcção do jornal Público, Miguel Tiago defendeu que "a confirmarem pressões com as caraterísticas descritas alguma consequência terá que haver".

"O primeiro patamar deverá ser clarificar, esclarecer, para apurar os contornos em que as pressões ocorreram, porque, quer o comunicado do Conselho de Redacção do Público, quer o comunicado evidenciam pressões, embora com versões diferentes", referiu.

Depois, continuou o deputado comunista, e caso se confirmem as pressões, terão que se retirar consequências, pois "uma pessoa que recorre a este tipo de expedientes não tem condições para continuar no Governo".

Questionado sobre se o PCP está disponível para apoiar o pedido do PS para que o ministro-adjunto e dos Assuntos Parlamentares vá ao Parlamento esclarecer o caso, Miguel Tiago notou que o seu partido "não tem por hábito opor-se à ida de membros do Governo à Assembleia da República".

"Tudo o que seja caminho para a clarificação é válido", disse, reiterando que caso as pressões se confirmem são "inaceitáveis".

Por seu lado, o PSD considerou que os media “não se deveriam colocar no papel da oposição ao Governo".

O Sindicato dos Jornalistas (SJ) vai solicitar a intervenção da Entidade Reguladora para a Comunicação Social e da Comissão Parlamentar de Direitos, Liberdades e Garantias. O SJ defende que, a confirmarem-se as ameaças e pressões imputadas ao ministro, este "deixaria de ter condições para se manter no Governo".

A Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) anunciou que vai iniciar esta semana averiguações ao caso, revelando que recebeu “uma série de documentos” sobre o caso, enviados “por iniciativa própria” pelo ministro.

Passos Coelho também nega pressões

O primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, rejeitou, no domingo, que Miguel Relvas tenha "atacado a imprensa" na resposta ao jornal Público e defendeu que "o Governo tem privilegiado muita transparência".

Em Chicago, Estados Unidos, à margem da Cimeira da NATO, Passos Coelho escusou-se a responder se Relvas tem condições para continuar no Governo, rejeitando falar sobre "questões de política interna" no estrangeiro. 

O primeiro-ministro rejeitou, contudo, ter havido um ataque à imprensa por parte do ministro-Adjunto e dos Assuntos Parlamentares.

"Não há nenhum ataque a coisa nenhuma. Se há coisa que o governo tem privilegiado é muita transparência nesse aspecto", disse o primeiro-ministro, escusando-se a responder a mais questões sobre o assunto.



Sem comentários:

Enviar um comentário