Euro é a segunda moeda mais importante do mundo
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Foto: Tessy Hansen |
Utilizado actualmente por
332 milhões de pessoas de 17 países, o euro entrou em circulação a 1 de
Janeiro de 2002, sendo hoje considerada a segunda
moeda
mais importante no mundo, depois do dólar.
"Há dez anos, no dia 1 de Janeiro de 2002, as notas e
moedas de euro foram introduzidas em 12 Estados-membros da União
Europeia”, lembra o presidente do BCE, Mário Draghi, no site da
instituição.
“A introdução do novo numerário constituiu um
desafio sem precedentes, mas decorreu com êxito. Em poucos dias,
encontravam-se em circulação milhares de milhões de notas e moedas de
euro”, considerou, acrescentando que “o euro tornou-se um símbolo da
Europa e as notas e moedas de euro passaram a fazer parte do nosso
quotidiano”.
Para assinalar o 10º aniversário da
moeda única, o Banco Central Europeu lançou um
concurso chamado "Eurocorrida", dedicado às crianças da "geração euro",
ou seja, com idade entre os 9 e os 12 anos e residentes na União
Europeia.
Além disso, o BCE pretende abrir portas ao público a
29 de Abril de 2012, para apresentar a história da
moeda única europeia e a sua produção.
Iguais em todos os países que utilizam esta
moeda,
as notas de euro foram desenhadas pelo d
esigner austríaco
Robert Kalina, vencedor do concurso lançado pelo Instituto Monetário
Europeu (precursor do BCE) em Fevereiro de 1996. A decisão foi tomada
por um júri de especialistas em
marketing ,
design e
história da arte e contou ainda com os resultados de uma sondagem de
opinião ao público europeu. A série de desenhos das notas tem como tema
“épocas e estilos da Europa”, tendo a sua produção começado em Julho de
1999 em 15 fábricas de notas da União Europeia. A 1 de Janeiro de 2002,
estavam impressas 14,9 mil milhões de notas – o suficiente para cobrir
uma área equivalente a 15 mil campos de futebol - destinadas aos 12
países que então faziam parte da zona euro. Na mesma altura foram
cunhadas cerca de 52 mil milhões de moedas, com um valor total de 15,75
mil milhões de euros, na produção das quais foram utilizadas 250 mil
toneladas de metal.
Embora uma das faces seja comum a todos os
estados-membros da zona euro, as moedas são diferentes consoante o país
onde são cunhadas.
Em meados de 2011 e de acordo com o BCE,
encontravam-se em circulação 14,2 mil milhões de notas e 95,6 mil
milhões de moedas, num montante total de, respectivamente, 847 mil
milhões e 22,8 mil milhões de euros. As notas de 50 euros representam a
maior percentagem em termos de volume (39,5 %), ao passo que as de 500
euros correspondem à maior percentagem em termos de valor (34,3 %),
seguidas de perto pelas de 50 euros (33 %).
A introdução da
moeda foi concluída em Fevereiro de 2002, sendo
que a 1 de Março desse ano já tinham sido retiradas de circulação mais
de 6 mil milhões de notas e perto de 30 mil milhões de moedas nacionais.
Dez anos depois, os cidadãos dos vários países ainda podem
trocar as suas antigas moedas por euros.
Nos próximos anos,
anuncia o BCE sem precisar a data, será introduzida uma segunda série de
notas de euro para “tornar o mais difícil possível a contrafacção”.
As novas notas manterão os elementos de desenho mais importantes
da primeira série de notas.
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A década de euro, e agora?
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José Luís Correia |
Há
exactamente 10 anos guardei os francos luxemburgueses, franceses,
belgas, os marcos, as pesetas e os escudos numa gaveta, saí eufórico e
fui atestar o meu carro com euros pela primeira vez. O gasóleo custava
então 0,7 euros. Dez anos volvidos, vale a pena eu continuar a ser um
euro-optimista?
Quando hoje criticamos o euro pela subida dos
preços, um aumento atestado por todos os estudos feitos sobre o assunto,
esquecemos o positivo que a moeda única trouxe. Nunca mais tivemos que
transportar meia-dúzia de porta-moedas com diferentes divisas ao viajar
pela Europa, nem nunca mais fomos "roubados" no câmbio. Câmbio, aí está
uma palavra que não digo há muito... Fazer parte da união económica e
monetária protegeu-nos também da onda de choque da crise financeira de
2008, que chegou até nós, sim, mas muito mais tarde e já menos
devastadora. Pertencermos ao euro permitiu também manter as taxas de
juro baixas até 2010 e 2011, em certos países da zona euro, e isto
apesar da crise.
Não esqueçamos também o prestígio que a nossa
moeda comum adquiriu nos mercados internacionais, graças ao seu
equilíbrio e ao peso político da Europa. Hoje o euro está ligado a 42
países do mundo: os 17 países da zona euro; os seis estados europeus
não-comunitários que adoptaram o euro como moeda principal ou segunda
moeda nacional; e 19 países africanos (entre eles, Cabo Verde) e do
Pacífico, que ligaram a sua moeda ao euro. O sucesso do euro fez até com
que alguns países do Golfo Pérsico imaginassem criar uma moeda comum,
que os "libertasse" do dólar.
Mas, passada a década de e(o)uro
dos anos dois mil, a nossa moeda enfrenta agora, no início dos anos
dez, uma grande crise, a "Grande Recessão", como lhe chamam já alguns
economistas. A forma como vai ser resolvida esta crise da dívida, nos
próximos meses e anos, vai reforçar ou fragilizar irremediavelmente a
UE. O presidente do Eurogrupo, Jean-Claude Juncker, bem o clama: "A
crise não é do euro, é de países como Portugal e Grécia". E é
precisamente para esse problema que é necessário encontrar uma solução.
Há os que são apologistas da "solução islandesa". A Islândia, cujo
Estado faliu em 2009 devido à crise internacional, conseguiu
reerguer-se, após três anos de rigor. Num momento em que a UE enfrenta
2012 ainda em recessão, a pequena ilha nórdica aponta para um
crescimento económico de 3 %. Qual é o milagre de Reykjavik? O Estado
islandês decidiu não salvar os bancos em crise, exactamente o contrário
do que fez a UE. Melhor, o Estado islandês decidiu não salvar os
accionistas, mas proteger os clientes.
Mas fazer isso a nível
europeu teria um efeito de contágio entre bancos que só contribuiria
para alastrar ainda mais a crise.
Para escapar à crise na zona
euro, há países que já equacionaram abandonar a moeda única e voltar às
suas antigas moedas fortes nacionais, para se protegerem das
turbulências dentro da eurozona. Outros falam em expulsar do grupo os
"maus alunos", como Atenas e Lisboa, e os que se seguirem. É a proposta
de Merkozy.
Economistas como Barry Eichengreen ("The Breakup
of the Euro Area", 2007), da Universidade de Berkeley, ou Michel Dévoluy
("L’euro est-il un échec?", 2011), da Universidade de Estrasburgo,
analisam as consequências de uma tal medida e afirmam que a saída
forçada do euro teria consequências nefastas para um estado-membro, mas
também para a UE.
Quer fosse a Grécia, Portugal ou outro país,
regressar, neste contexto de crise, à moeda nacional seria desastroso,
afirmam. Isso levaria a desvalorizar a moeda, o que provocaria viver uma
corrida desenfreada aos bancos por parte dos clientes, que não
quereriam perder poder de compra, e, por consequente, iss poderia
conduzir à fragilização ou mesmo à falência de alguns bancos.
Acrescente-se a isso uma forte inflação, fuga dos investidores, aumento
das taxas de juro. O regresso à divisa nacional custaria também
extremamente caro no fabrico da nova moeda fiduciária, na sua colocação
em circulação, da reconversão de todo o sistema monetário e financeiro, e
na redefinição da política monetária nacional. Recordemos o tempo e o
dinheiro que custou a introdução do euro. A conversão de todos os preços
e salários, só por si, poderia levar a tensões sociais ainda mais
graves do que as que o país enfrenta hoje. E o impulso nacional
pretendido não aconteceria.
Nas relações exteriores, entre o
estado "expulso" da zona euro e os que o teriam deixado à sua sorte,
poderiam mesmo nascer tensões e novos nacionalismos, desaparecidos nos
séc. XIX e XX. O país expulso poderia mostrar-se cada vez mais reticente
também em aceitar o controlo de Bruxelas e,
in fine , poderia
até decidir sair da UE.
É verdade que hoje há estados-membros
dentro da UE e fora do euro, mas são-no por opção. A saída forçada ou
voluntária do euro seria profundamente negativa para a imagem da moeda
única e da UE. A força e o prestígio da UE e da sua divisa vêm-lhe
sobretudo da imagem de equilíbrio económico, geopolítico e de ajuda
mútua que os seus estados-membros devem uns aos outros.
Para
Dévoluy pode vir a ser decidida uma divisão da zona euro em dois grupos.
Por um lado, estados que optassem por uma governância económica comum e
mais federalismo. Por outro, estados que regressassem às suas moedas
nacionais. Mas esta Europa a duas velocidades, decidida em época de
crise, poderia ser vista como a tentativa de salvar os bons alunos e de
ostracizar os maus, o que descredibilizaria a UE.
Dévoluy
considera que uma das soluções à crise do euro é mais federalismo, mas
isso implica um novo paradigma político para a UE, mais do que
propriamente económico. Dévoluy preconiza a troca da doutrina neoliberal
da UE por uma "ordoliberal", isto é, uma doutrina económica baseada na
estabilidade dos preços e na "virtude orçamental". Ou seja, liberal, mas
com ordem, com regras, que evitem ou corrijam as derivas dos mercados.
Foi esta "terceira via", a meio caminho entre o socialismo e o
capitalismo, que permitiu "o milagre económico alemão" no pós-Segunda
Guerra Mundial.
Mas a actual posição do Reino Unido, que
bloqueou a possibilidade de uma maior governância económica comum,
parece ter deixado o euro num impasse.
Tanto Eichengreen como
Dévoluy alertam: é preciso salvar o euro, porque o seu fim provocaria a
maior de todas as crises na Europa, e até conduzir ao desmembramento da
própria UE.
José Luís Correia
Chefe de Redacção do CONTACTO
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O euro provocou a crise, ou foi a crise que abalou o euro?
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Sérgio Ferreira Borges |
A evolução dos números mundiais permitem hoje
afirmar, com elevado grau de certeza, que dentro de oito anos nenhuma
das economias europeias figurará entre as cinco maiores do planeta. Uma
simples observação, à vista desarmada, já permite essa conclusão. Mas há
mais.
Uma nota recente do CEBR, o "Centre for Economics and
Business Research," espantou o mundo ao atestar que o Brasil é hoje a
sexta economia mundial, tendo ultrapassado o Reino Unido. E o mesmo
estudo adianta que, em 2012, esse lugar se manterá o que significa que o
crescimento do Brasil parece ser absolutamente consolidado.
Pelo contrário, a descida do Reino Unido mostra-se imparável e, dentro
de oito anos, terá descido mais dois lugares, sendo então a oitava
economia. Esta é a primeira amostra de uma realidade muito mais dura.
Actualmente, entre as cinco maiores economias do mundo ainda estão
duas europeias, a Alemã em quarto lugar e a França em quinto. Nos
lugares cimeiros por esta ordem estão os Estados Unidos, a China e o
Japão, o que não constitui novidade de maior.
Em 2020, tudo
será pior para a Europa. Os Estados Unidos vão manter a liderança,
seguidos mais uma vez pela China e pelo Japão que não dá sinais de
recuperar o segundo lugar, perdido há um ano. No quarto e no quinto
lugar vão aparecer dois países BRIC, a Rússia e a China, por esta ordem.
Como já disse, o Brasil manterá o sexto lugar, à frente da
Alemanha, a maior economia da Europa. E depois, por esta ordem, vão
aparecer o Reino Unido, a França e a Itália. Isto é, todos os países
BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) vão ultrapassar todas as economias
europeias. Mas há outros dados interessantes. A Índia, por exemplo,
actualmente no décimo lugar, vai saltar cinco patamares, para se situar
em quinto lugar. O mesmo vai acontecer com a Rússia, que salta do actual
nono para um invejável quarto posto. China e Brasil, como já se disse,
vão manter as posições de agora. Dito isto, quem pode duvidar da extensa
dimensão da crise europeia?
Por estes dias, o euro comemora
nostalgicamente os seus 10 anos de vida, sem grandes certezas sobre o
futuro. E com uma questão nuclear que importa esclarecer: foi a crise
financeira que rebentou com o euro, ou é o euro que está rebentar com a
economia?
O euro sofreu com a crise financeira despoletada nos
Estados Unidos, em 15 de Setembro de 2008 e que rapidamente contaminou a
Europa e o resto da economia mundial. Sofreu, como sofreram todos os
instrumentos da economia. Digamos que até este momento o Euro é vítima e
não vilão.
Mas a turbulência financeira que entretanto se
instalou na Europa veio colocar problemas de toda a ordem,
concretamente, veio reduzir o investimento público e o privado e a
economia foi entrando em recessão. Durante quase dois anos, o poder
político tentou esconder isso mas a tragédia tornou-se por demais
visível.
Na Europa, o poder político não foi capaz de reagir à
crise financeira. Numa primeira fase, assustado, abriu os cordões à
bolsa para atacar os problemas sociais que a crise estava a despoletar,
como por exemplo o desemprego.
Mas os mercados castigaram essa
benevolência com aumentos sucessivos das taxas de juro e o poder
político recuou, mas sem saber para onde. Começou então a austeridade
violenta em meados de 2010 e a recessão económica tornou-se mais
evidente. Até aqui, o Euro não teve culpa de nada.
O mal do
euro reside no facto de ter sido criado à pressa e depois mal gerido,
sacrificado aos interesses das políticas monetaristas de alguns estados,
como a Alemanha. Como estava escrito no Pacto de Estabilidade e
Crescimento, a segurança da moeda única era feita à custa do controle
inflacionista. Isso começava por manter sob apertada vigilância o défice
orçamental de alguns estados, evitando que fossem aos mercados à
procura de dinheiro, criando com isso uma inflação que depois se
espalharia pelos outros estados da zona Euro. Aqui residiu o grande
falhanço, mais nítido no consulado de Jean-Claude Trichet, à frente do
Banco Central Europeu. Nunca conseguiu outro instrumento para controlar a
inflação que não fosse a subida das taxas de juro. E com isso, fez
definhar a economia.
Outra questão mal resolvida é a do valor
cambial contra o dólar com uma constante sobreavaliação que se cifra
hoje nos 1.3, favoráveis ao euro. Isto, é evidente, prejudicou sempre as
exportações europeias, ainda que Durão Barroso continue a dizer que a
Europa é o maior exportador mundial. Trichet nunca conseguiu equilibrar
essa relação de valor com a moeda americana.
Finalmente, uma
última questão, consequência da anterior. O Euro nunca se conseguiu
impor como moeda do comércio internacional, nem sequer apoquentou o
dólar. Essa terá sido até a primeira grande derrota. Há países na zona
euro que negoceiam entre si com a moeda americana.
A última
derrota, que todos querem evitar, é o fim do euro. Mas há estados,
especialmente os sobre-endividados, que estudam essa possibilidade. As
eventuais deserções não significam, necessariamente, o fim do Euro, mas
abalam decisivamente a sua reputação. E resta saber como poderá
sobreviver com as economias europeias em queda acelerada. Foi o Euro que
provocou a crise, ou a crise que abalou o Euro? Quem nasceu primeiro,
foi o ovo ou a galinha?
Sérgio Ferreira Borges, analista político
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A primeira década é a mais difícil
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Hugo Guedes |
Parabéns, euro! A moeda europeia faz dez anos, mas pouca gente apareceu
à festa – numa lamentável demonstração da ingratidão humana. A 1 de
Janeiro de 2002, a Pont-Neuf de Paris iluminou-se com as cores azuis e
douradas da União Europeia, enquanto em Frankfurt o fogo de artifício
marcava o momento em que os europeus começaram a poder tocar o seu novo
dinheiro (em rigor, 2002 marca apenas o início da existência física do
euro, que teve o seu verdadeiro nascimento três anos antes, em 1999).
Hoje, em 2012, nem sequer Bruxelas tem preparada uma cerimónia para o
seu rebento com uma década; o ambiente reinante no continente é tão
negativo que celebrações de qualquer espécie parecem verdadeiro anátema.
O euro tem, basicamente, dois problemas existenciais a
ultrapassar – e não é este ano que o vai fazer, dado que até agora uma
década não chegou para tal. Um é o facto de ter nascido incompleto; o
outro é a proeza de mesmo assim constituir um adversário formidavelmente
perigoso – e como tal ter granjeado inimigos poderosos. A criação da
moeda única amputada dos mecanismos essenciais ao seu funcionamento,
como uma união fiscal e política ou mecanismos de solidariedade entre os
seus participantes, já foi sobejamente discutida (inclusive na altura).
Mas o facto de o euro ser agora a segunda moeda de referência a nível
mundial, com cerca de 25 % das reservas conhecidas, e fazer sombra ao
poderio do dólar – poderio esse que permite aos Estados Unidos
financiarem a sua dívida galopante às taxas mais baixas do mercado – não
é perdoado pela "sombra", a elite não eleita que põe e dispõe sobre a
economia mundial. Os grandes meios de comunicação global anglo-saxónica,
por exemplo, simplesmente abafam o lado positivo (que casualmente é
também o mais importante) da história: esta década assistiu à criação de
uma nova moeda que a) é forte; b) é estável; c) alçou as populações
para um novo patamar de prosperidade (sobretudo aquelas que vinham de
uma moeda fraca, como o escudo – quantos portugueses viajavam para o
estrangeiro antes de 2002?); d) é reconhecida e adoptada globalmente; e)
é essencialmente popular, pois eliminou taxas de câmbio e barreiras,
contribui para um mercado único, simboliza a paz e a integração do
projecto europeu. Nenhuma sondagem mostra uma maioria de pessoas que
gostariam de voltar às moedas nacionais, mas não é essa a impressão com
que ficamos lendo os títulos da imprensa internacional, a mesma que faz
caixa de ressonância da palavra "crise" a um ritmo enjoativo. Nem sequer
o mantra colectivo de "o euro fez tudo ficar mais caro" resiste a uma
análise um pouco mais séria: se isso foi verdade em relação a produtos
de reduzido valor facial (como o café ou a fruta), para muitos produtos
de preço mais alto aconteceu o inverso, equilibrando o cabaz de compras.
E dado que na última década a inflação acumulada foi de 26,5 %, algo
que custasse 10 contos custaria de qualquer forma hoje em média 12.650
escudos (ou 63 euros, e não 50).
E Portugal? A possibilidade
de voltar ao escudo, essa magnífica moeda das "desvalorizações
competitivas", é real e está em cima da mesa. O escudo, relembremos, foi
criado em 1910 e quatro anos depois já só valia 5 % da paridade inicial
com a libra esterlina; a tradição manteve-se e as desvalorizações de
1979 e 1983 (esta imposta pela primeira visita do FMI) tornaram os
portugueses sempre mais pobres, mas ajudaram o país a compor as suas
contas e sair da crise. O preço a pagar agora, no entanto, seria muito
elevado: incapazes de competir de outra forma que não pelo preço, a uma
desvalorização inicial (calculada em 30 %) seguir-se-iam inevitavelmente
outras, condenando o país à irrelevância e autarcia que tão bem
conhecemos de outras épocas.
Hugo Guedes
*As crónicas de Hugo Guedes podem ser
lidas no blogue associado do CONTACTO, em
www.naruadagrandecidade.blogspot.com
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Autor: Alexandre Torres (in jornal CONTACTO, 04/01/2012) |
Perguntas e respostas sobre a moeda única
A 1 de Janeiro de 2012 celebram-se os dez anos da introdução das
notas e moedas de euro. Eis alguns factos sobre as notas e as moedas da
divisa utilizada em Portugal ao longo da última década:
Ao todo,
quantos euros há em circulação em "dinheiro vivo"?
Segundo o Banco
Central Europeu (BCE), no final de Novembro de 2011 havia 868 mil
milhões de euros em notas de euro em circulação. De acordo com os mesmos
dados, a nota mais numerosa é a de 50 euros – havia 5.780 milhões
destas notas em circulação no mês passado.
E as moedas?
No
final de Novembro de 2011, as moedas em circulação representavam um valor de 23
mil milhões de euros. A mais numerosa é também a de denominação mais
pequena – havia 24 mil milhões de moedas de um cêntimo a circular.
Porque
é que não se pode dizer que o euro foi fundado há dez anos?
Porque
o que ocorreu em 2002 foi apenas a entrada em circulação de notas e
moedas. Desde 1 de janeiro de 1999 que, em termos de política
monetária, as moedas nacionais como o escudo deixaram de ter existência
independente.
Quantos países usam o euro?
O euro é a moeda
oficial de 17 países – Alemanha, Áustria, Bélgica, Chipre, França,
Eslovénia, Eslováquia, Espanha, Estónia, Finlândia, Grécia, Holanda,
Irlanda, Itália, Malta, Luxemburgo e Portugal.
E estão todos no
euro desde o início?
Não. Portugal e Luxemburgo fazem parte do grupo de 11
fundadores que está na moeda única desde o seu início. A Grécia não
cumpria inicialmente os critérios de adesão, e só se juntou à união
monetária em 2001.
Com a expansão da União Europeia a Leste a
partir de 2004, a zona euro também ganhou vários novos membros. Em 2007,
aderiu a Eslovénia; em 2008, Chipre e Malta; em 2009, a Eslováquia; e,
em 2011, a Estónia.
Quem é que fabrica as notas e moedas
do euro?
A produção de notas é descentralizada por denominações e
está a cargo dos bancos centrais dos 17 estados-membros. As moedas de
cada país são produzidas por entidades nacionais; em Portugal, a
cunhagem de moedas de euro cabe à Casa da Moeda. No Luxemburgo, a tarefa cabe ao Banco Cenntral do Luxemburgo.
Como é que se
pode saber se uma nota foi fabricada em Portugal?
Verifique o
número de série da nota; a letra antes do número identifica o país onde
ela foi produzida. A letra “U”, por exemplo, refere-se à França; a letra
“X” significa notas da Alemanha. Se a letra for “M”, a nota foi
fabricada em Portugal.
Onde ficam os edifícios retratados nas
notas de euro?
Em lado nenhum. As pontes, janelas, pórticos e
fachadas retratados nos euros saíram da imaginação do artista austríaco
Robert Kalina, e retratam estilos arquitetónicos da história da Europa.
Quanto mais valiosa a nota, mais recente o estilo. Por exemplo: a nota
de 5 euros é ilustrada por motivos arquitetónicos no estilo “clássico”, a
20 é de estilo “gótico”, a de 50 é “renascentista”, e a nota de 500 tem
arquitetura “moderna”.
E os desenhos das moedas?
As moedas
de euro têm uma face comum e uma face nacional. As faces nacionais das
moedas portuguesas foram desenhadas por Vítor Manuel Fernandes dos
Santos, que utilizou os três selos reais de D. Afonso Henriques,
rodeados por castelos e escudos de Portugal, e pelas 12 estrelas da
União. A face nacional da moeda de euro luxemburguesa foi concebida pela artista Yvette Gastauer-Claire e apresenta o perfil do Grão-Duque Henri.
É possível haver euros de países que não pertencem à zona
euro?
Há moedas de euro de países que nem sequer são membros da
União Europeia: Mónaco, São Marino e Vaticano.O euro é também aceite como moeda principal ou segunda moeda nacional em Andorra, no Kosovo e no Montenegro.
Ainda se pode
trocar notas e moedas nacionais?
Na maior parte dos países, e para as moedas, o prazo acabou no
fim de 2002. Em portugal e no caso das notas, o prazo estipulado é 20 anos depois da data
de retirada de circulação da chapa. Ou seja, para notas mais recentes,
como a de 2000 escudos com Bartolomeu Dias, o período de troca ainda se
prolonga pelos próximos dez anos.
Porque é que o euro se chama
euro?
Segundo um panfleto da Comissão Europeia, considerou-se a
possibilidade de usar a designação do cabaz de moedas do sistema
monetário europeu - Ecu – para a moeda única.
No entanto, Ecu foi
rejeitado porque “a França já tinha tido uma moeda com esse nome”, a
palavra “lembrava o escudo português” e “o som em alemão é parecido com a
expressão 'uma vaca'”. Acabou por se chegar ao nome “euro”, que cumpre
os requisitos de ser pronunciável em todas as línguas da União, fácil de
escrever em todos os alfabetos, e não ter nenhuma referência óbvia às
antigas divisas (marco, franco, florim, etc.).
Qual é a mais
valiosa moeda de euro?
O euro é uma divisa recente, mas algumas
das suas moedas já são peças de coleção. Segundo o site
www.2euro-preise.de, a moeda de euro mais preciosa foi emitida pelo
Mónaco em 2007, uma edição comemorativa de uma moeda de dois euros com a
efígie da princesa e antiga atriz Grace Kelly. Estas moedas são
transacionadas por mais de mil euros cada.
E a nota mais valiosa?
As
notas não despertam o mesmo interesse dos numismatas. No entanto, a
nota de maior denominação, a de 500 euros tem uma grande procura, porque
permite concentrar um grande valor monetário num número relativamente
pequeno de notas.
Isso fez com que a nota de 500 euros se
tornasse popular entre criminosos. Em 2006, um quarto de todas as notas
de 500 euros estavam em Espanha, obrigando as autoridades espanholas a
empreender ações contra o tráfico e o branqueamento de capitais.
Quanto valia um euro em escudos e em francos luxemburgueses?
A taxa de
conversão do escudo para euros foi fixada definitivamente a 31 de
dezembro de 1998: um euro valia 200,482 escudos e 40 francos luxemburgueses.
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Foto: Tessy Hansen |
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Moeda única representa 25 por cento das reservas
A moeda única europeia representava no final do ano passado 26 por
cento das reservas conhecidas dos bancos centrais globais, sete pontos
percentuais acima do peso que tinha quando entraram em circulação as
notas e moedas do euro.
No entanto, é difícil medir ao certo qual é
o peso do euro enquanto moeda de reserva, porque a composição de quase
metade das reservas mundiais não é conhecida.
“O euro é um ativo
de reserva importante, o segundo mais importante a seguir ao dólar. Esse
papel não deverá alterar-se nos próximos anos a menos que a zona euro
se desmembre”, disse à agência Lusa Marc Chandler, chefe de estratégia
cambial do banco de investimentos nova-iorquino Brown Brothers Harriman.
Marc Chandler acrescenta contudo que o peso do euro corresponde
“basicamente à soma das suas partes”, nomeadamente o marco alemão e o
franco francês.
A COFER - base de dados sobre divisas do Fundo
Monetário Internacional (FMI) - é a mais completa fonte de informação
sobre as reservas dos bancos centrais mundiais. Os seus dados estão
divididos em reservas de composição conhecida ("allocated") ou
desconhecida ("unallocated").
Segundo a COFER, as reservas totais
mundiais correspondiam, em 2010, a 9,3 biliões de dólares. Deste valor,
5,1 biliões eram reservas de composição conhecida.
Entre as
reservas de composição conhecida, 61,8 por cento estavam denominadas em
dólares e 25,9 por cento em euros (as outras divisas mundiais têm todas
percentagens pequenas do total, sendo a maior a da libra esterlina, com
3,9 por cento).
Em 2001, o dólar representava 71,5 por cento das
reservas mundiais conhecidas, o euro 19,2 por cento (ver tabela abaixo).
Além
disso, notava um relatório do Banco Central Europeu (BCE) em 2008, “a
atual percentagem do euro nas reservas oficiais a nível mundial é mais
elevada do que a percentagem da soma de todas as moedas que o euro
substituiu – incluindo o marco alemão – que correspondia a cerca de 18
por cento em 1998”.
Marc Chandler considera contudo que este valor
é “artificial”: “Esses dados foram influenciados por [os bancos
centrais] se estarem a ajustar para a entrada do euro, e já tinham
começado a reduzir suas reservas de outras moedas europeias. Era melhor
olhar para o que havia antes de o tratado Maastricht ter sido assinado
[em 1992]. E aí, o marco e o franco tinham à volta de 25 por cento [das
reservas mundiais], o mesmo que agora.”
É preciso ainda considerar
as reservas de composição desconhecida – que têm vindo a crescer a um
ritmo muito mais forte que as conhecidas. Em 2001, as reservas
desconhecidas representavam menos de 23,5 por cento do total; em 2010,
já eram quase 45 por cento, sempre segundo os dados da COFER.
As
reservas cuja composição não é divulgada pertencem sobretudo a países do
Médio Oriente (particularmente os exportadores de petróleo) e da Ásia
(sobretudo a China).
Marc Chandler considera que “o grosso” do
crescimento nas reservas não conhecidas está na China e em Taiwan.
“Diria
que os dados que se conhecem apontam para que as reservas chinesas
sejam mais ou menos dois terços em dólares dos EUA, outra fatia [de
perto de um quarto] em euros, e o resto em outras divisas, como o dólar
australiano”, acrescenta Chandler. Ou seja, uma divisão muito semelhante
à repartição das reservas mundiais conhecidas.
Ainda quanto às
reservas conhecidas, note-se que a proporção do euro já atingiu os 27,5
por cento em 2009 – mas reduziu-se no ano passado, à medida que se
desenrolava a crise das dívidas soberanas europeias.
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MOEDA ÚNICA: 10 ANOS EM FRASES
 |
Foto: Anouk Antony |
Quarenta frases de líderes políticos e económicos, escolhidas entre
discursos e promessas feitos na altura em que o euro foi introduzido e
10 anos depois, mostram que as preocupações foram transferidas da moeda
em si para o sistema europeu.
Por um lado, fica patente que, no
final de 2001 e início de 2002, a preocupação dos líderes europeus
centrava-se sobretudo na entrada em vigor da moeda e aceitação das
populações.
Nessa altura havia uma nota de otimismo no ar que dava
ao euro, enquanto moeda única, um papel unificador e potenciador da
Europa.
Ainda assim, alguns dos responsáveis faziam declarações
que podem ser vistos hoje como premonições ou até como ironias, já que a
situação alterou-se muito nesta década.
Dez anos depois, as
atenções dos líderes centram-se muito mais no euro enquanto sistema e
enquanto motor de uma divisão inesperada na união Europeia.
A
dívida crescente, a crise económica e financeira e as contradições
políticas parecer ser atualmente a marca da moeda única.
Algumas dessas frases:
“Portugal é um país que tem dificuldades
maiores que outros..."
Comissário europeu dos Assuntos
Financeiros e Monetários, Pedro Solbes, 28 fev 2001
“A alguns
meses da sua efetiva introdução, devemos mais do que nunca sublinhar
aos cidadãos [europeus] tudo o que o euro nos proporciona em
estabilidade e confiança”.
Presidente francês Jacques Chirac, 23
mar 2001
“O euro é um instrumento fundamental para reforçar a
credibilidade do projeto europeu, não só nos planos económico e
monetário, como no político”
Primeiro-ministro António Guterres, 04
abr 2001
“Alguns destes projetos terão de ser repensados para
conter a despesa pública”.
Governador do Banco de Portugal Vítor
Constâncio (sobre os projetos da Ota, TGV e Euro 2004), 18 jun 2001
“Para que a zona euro funcione sem choque, políticas económicas
nacionais bem equilibradas deveriam complementar a política monetária
única com o objetivo prioritário de manter a estabilidade dos preços em
toda a zona euro”, Presidente do Banco Central Europeu Wim
Duisenberg, 21 jun 2001
Portugal “estaria em grandes
dificuldades económicas se não beneficiasse da credibilidade e proteção
do euro”. Ex-governador do Banco de Portugal Miguel Beleza, 10
jul 2001
“Numa zona monetária tão grande e dotada de uma tal
pujança económica, será menos fácil especular”
Ministro alemão das
Finanças Hans Eiche,02 set 2001
“A moeda única vai dar
asas a médio e longo prazo à economia europeia. Espero um efeito duplo: a
produtividade na Europa vai aumentar e, ao mesmo tempo, as exportações
vão crescer”
Presidente da Comissão Europeia Romano Prodi, 05
set 2001
“O Eurogrupo deverá guardar o seu carácter informal
durante mais dois ou três anos, mas quando a União Europeia tiver 25 ou
27 membros, esta estrutura informal deixará de poder funcionar”
Presidente
do Eurogrupo Didier Reynders, 19 set 2001
“Portugal não vai
sacrificar o investimento público e as despesas sociais ao cumprimento
do défice público”
Ministro das Finanças Guilherme d’Oliveira
Martins, 22 set 2001
“É plenamente do nosso interesse que o
euro tenha bom êxito”
Primeiro-ministro britânico Tony Blair, 30
dez 2001
“Fogo-de-artifício e raios laser vão iluminar o céu de
Atenas, na noite de passagem de ano, durante um espetáculo musical
encomendado pelo governo grego para a chegada do euro”
Produtor do
espetáculo, Peter Massine, 31 dez 2001
“Recuso hoje
qualquer pedido de adiamento, neste momento, da data de 2004 para
atingir o equilíbrio orçamental em Portugal”, Ministro das Finanças
Guilherme d’Oliveira Martins, 05 fev 2002
“Podemos já olhar
para além do euro. No domínio económico e monetário devemos agora
avançar, depois da passagem ao euro, para um verdadeiro Conselho
Económico da União”, Ministro francês da Economia e Finanças
Laurent Fabius, 17 fev 2002
“Crescimento da economia
portuguesa caiu de forma acentuada em 2001, devido ao fim do efeito do
corte da taxa de juros e do endividamento privado resultante, que se
seguiu à criação do euro”, FMI, em comunicado, 26 abr 2002
“Penso
que o projeto europeu está realmente a viver um período de grandes
perigos, talvez o mais grave de que se lembra a minha geração”,Membro
do BCE Tommaso Padoa-Schioppa (sobre euroceticismo na Europa), 17
mai 2002
“Subida dos preços devido à introdução do euro é muito
penalizadora para os consumidores e dificulta o início da recuperação
económica, Ministro alemão das Finanças Hans Eichel, 02 jun
2002
“Deveriam ser implementadas sanções quando as boas condições
não são utilizadas para reduzir a dívida”
Presidente do Bundesbank
Ernst Welteke, 10 jul 2002
“É preciso compreensão dos
parceiros da zona euro para o esforço que Portugal está a fazer para
reduzir o seu défice orçamental. Acho que todos estão sensibilizados”
Ministra
das Finanças Manuela Ferreira Leite, 06 Set 2002
“O
que vemos na Irlanda e em Portugal não tem uma relação direta porque em
Portugal o setor bancário continua em relativa boa saúde”, Líder
do Eurogrupo Jean-Claude Juncker, 22 nov 2010
“Portugal não
tem qualquer problema no seu sistema financeiro”, Primeiro-ministro
José Sócrates, 22 nov 2010
“O euro não é o problema",Presidente
da Comissão Europeia José Manuel Durão Barroso, 24 nov 2010
“Nenhum
país renunciará voluntariamente ao euro, para os países economicamente
mais fracos isso seria um suicídio, mas também para os países mais
fortes”, Diretor do Fundo Europeu de Estabilização Financeira,
Klaus Regling, 25 nov 2010
“Portugal tem todas as condições
para se financiar nos mercados. Estou confiante de que a aprovação do
Orçamento do Estado vai contribuir para reforçar a confiança dos
mercados", Primeiro-ministro José Sócrates, 26 nov 2010
“Não
devemos subestimar a importância da crise, que, na Irlanda, partiu
essencialmente do setor bancário”
Diretor geral do FMI Dominique
Strauss-Kahn, 02 dez 2010
“O euro é a mais sólida moeda do
mundo”, Presidente do Eurogrupo Jean-Claude Juncker, 31 dez
2010
“A discussão sobre o FMI é uma discussão lateral e Portugal
tem tantos problemas, que todos os políticos se devem concentrar naquilo
que é essencial”, Deputado do PS António José Seguro, 09 jan
2011
“Portugal “não terá que aceder a qualquer plano de resgate”, Ministra
da Economia espanhola Elena Salgado, 10 jan 2011
“Portugal
não vai pedir nenhuma ajuda financeira, nenhuma assistência financeira,
pela simples razão que não é necessário", Primeiro-ministro José
Sócrates, 11 jan 2011
“Reduzir salários pode ser uma medida
eficaz a curto prazo no combate à crise financeira, mas não deve ser a
estratégia portuguesa para aumentar a competitividade”, Comissário
europeu da Concorrência, Joaquín Almunia, 14 jan 2011
“Não
haverá nenhum regresso ao marco, pelo menos comigo, e em nome da
Alemanha digo claramente não”, Chanceler alemã Angela Merkel, 19
jan 2011
“O euro é um símbolo da Europa. O euro é a Europa e a
Europa significa 60 anos de paz no nosso continente, por isso nunca
vamos deixar o euro ser destruído”, Presidente francês Nicolas
Sarkozy,
27 jan 2011
“Portugal só deve encarar soluções
externas quando forem racionalmente vantajosas”, Presidente do PSD
Pedro Passos Coelho, 10 fev 2011
“O pior já passou”, Ministro
grego das Finanças Georges Papaconstantinou, 25 mar 2011
“Foram
as hesitações alemãs que reforçaram a crise na Grécia e conduziram ao
contágio que se transformou numa crise existencial para a Europa”, Investidor
norte-americano George Soros,
12 ago 2011
“Quem não cumprir,
tem de ser obrigado a cumprir”, Chanceler alemã Ângela Merkel, 26
set 2011
“A ação do BCE foi rápida, orientada e decisiva. Mas não
podemos arcar com o ónus de resolver os problemas sozinho. Os Governos
da área do euro têm de assumir as suas responsabilidades”, Vice-presidente
do BCE Vítor Constâncio, 10 out 2011
“Creio que podemos
fazer desta crise uma oportunidade de êxito, tanto para a Europa como a
Grécia”
Primeiro-ministro grego Yorgos Papandréu, 13 out 2011
“Quando
uma agência avalia um Estado, deve ser obrigada a divulgar publicamente
todos os elementos que a levaram a fazer essa notação”, Comissário
europeu dos serviços financeiros Michel Barnier, 15 nov 2011
“A
França e a Alemanha defendem um novo tratado europeu que refunde e
repense a organização da Europa”, Presidente francês Nicolas
Sarkozy, 01 dez 2011
“Não estamos apenas a falar sobre uma
união orçamental, estamos prestes a realizá-la”
Chanceler alemã
Angela Merkel, 02 dez 2011
“A zona euro é defeituosa desde a
sua criação”, Antigo presidente da Comissão Europeia Jacques Delors,
03
dez 2011
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Portugueses adaptaram-se facilmente porque viram
nova moeda como aproximação à Europa - sociólogos
A adaptação dos portugueses ao euro foi fácil e feita com otimismo
porque a adoção da moeda única foi vista como uma aproximação à
modernidade da Europa mais desenvolvida, defendem três sociólogos
ouvidos pela Lusa.
Para Elísio Estanque, sociólogo e professor da
Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, a introdução do euro -
a 01 de janeiro de 2002 - foi recebida com "entusiasmo" pelos
portugueses porque "as novas notas e moedas, ao surgirem com toda a sua
aura de novidade e de modernidade europeia, contribuíram para tornar
Portugal e as subjetividades dos portugueses mais próximas da Europa".
Por
um lado, referiu, "a moeda única facilitou de facto as transações e a
circulação de pessoas e bens entre os países membros", mas também "criou
a ilusão de que estávamos mais desenvolvidos, mais iguais aos modos de
vida dos países mais ricos e pertencíamos ao clube dos mais
desenvolvidos".
Essa ilusão, adiantou, "alimentou muito o sonho
(da classe média sobretudo) de que podíamos a partir daí adotar os
padrões de vida consumistas vigentes nos países mais ricos e nas
economias mais poderosas".
Uma visão partilhada pelo sociólogo e
vice-reitor na Universidade de Lisboa e investigador coordenador do
Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, Manuel
Villaverde Cabral.
"A adoção do euro em Portugal foi tanto mais
rápida quanto funcionou como símbolo de prestígio que nos equiparava à
'Europa'", disse, acrescentando que a nova moeda "funcionou também como
um sinal exterior de riqueza usado por uma classe média que pretendia
imitar as elites tradicionais".
O sociólogo e investigador do
Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, António Costa
Pinto, acrescentou ainda que "os portugueses nunca manifestaram nenhuma
ligação particular ao escudo", ao contrário do que aconteceu com os
alemães e o marco, já que "vinham de experiências de desvalorização
competitivas, em 1978 e em 1983 com a intervenção do FMI".
No
entanto, consideraram estes especialistas, esta facilidade na adaptação
teve consequências que levaram mesmo à situação de endividamento que
caracteriza hoje as famílias portuguesas.
"Foi um caso prodigioso
de 'ilusão monetária'", lembrou Manuel Villaverde Cabral.
"Estávamos
no 'pelotão da frente' e éramos ou íamos ser todos ricos", referiu,
adiantando que "muita gente nova de origens algo modestas adorou a
'modernidade' do euro e o seu valor inflacionado por comparação com as
lojas de Oxford Street em Londres, onde de repente passaram a poder
fazer compras. É aí também que está a origem do nosso endividamento".
Para
Elísio Estanque, "a noção diferente acerca do dinheiro não se deveu
apenas à nova moeda, mas ao contexto social mais geral, marcado por uma
certa euforia no plano do consumo".
Embora reconhecendo um aumento
"muito significativo" dos preços com a adoção do euro - uma bica
custava em 2001 entre 60 e 80 escudos e muito rapidamente se aproximou
dos 50 cêntimos na nova moeda (ou seja dos 100 escudos), custando hoje
60 a 80 cêntimos - a crença geral foi de "desafogo fácil".
Também
para Costa Pinto o euro provocou um aumento do custo de vida, quer
"devido aos arredondamentos, quer porque os portugueses passaram a
gastar mais por falta de noção".
Já um eventual regresso ao escudo
precisaria de uma adaptação muito mais longa e seria muito mais penosa
para os portugueses, defenderam.
"Penso que [a adaptação] levará
sempre menos tempo quando a entrada da nova moeda acarreta benefícios ou
- o que é o mesmo, - cria a ilusão de que só traz benefícios", explicou
Elísio Estanque.
Para este sociólogo, "se ocorrer o regresso do
escudo e isso acontecer - como é provável - num contexto de maior
privação ou de intensificação drástica da austeridade, o tempo de
adaptação durará mais".
"A passagem ao escudo numa conjuntura de
crise será sempre vista como uma derrota de Portugal", secundou António
Costa Pinto, argumentando que o regresso à moeda nacional "será visto
como uma ameaça de desvalorização muito significativa" e constituirá "um
elemento de dramatização da crise que Portugal enfrenta".
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Habitantes de aldeias da Guarda ainda têm
dificuldades em manusear moeda única
 |
Foto: LUSA |
Dez anos depois da entrada em vigor do euro, os habitantes de muitas
localidades da região da Guarda ainda fazem as contas em escudos e têm
dificuldades em lidar com a moeda europeia.
"As pessoas mais
idosas ainda não se adaptaram e têm problemas com o euro", disse à
agência Lusa o presidente da Junta de Freguesia de S. Pedro do Jarmelo.
A
freguesia abrange as aldeias de Urgueira, Donfins, Ima, Pereira,
Granja, Almeidinha, Devesa e Mãe de Mingança (metade), onde residem
cerca de 200 pessoas, maioritariamente idosas.
O autarca Hermínio
Cabral contou que algumas mulheres da terra "vão ao padeiro ou ao
azeiteiro [vendedor ambulante] e dão-lhe a carteira para as mãos para
serem eles a retirar a quantia com que fazem o pagamento".
"Verifica-se
que as pessoas de idade ainda têm dificuldades em trabalhar com o euro.
Por vezes, digo-lhes que um euro representa 200 escudos mas, nem assim
conseguem encarreirar com a moeda", admitiu.
Hermínio Cabral
relatou ter assistido a situações em que "as pessoas julgam que uma nota
de 10 euros equivale a 10 contos de réis [mil escudos]".
Maria
José Trindade, 88 anos, moradora na aldeia de Urgueira, onde habitam
cerca de 15 pessoas, reconheceu que no dia a dia, o seu pensamento ainda
"foge para o escudo" mas nunca teve problemas com a moeda única, embora
a adaptação inicial tenha custado "um bocadito".
"Lido com o euro
e já não penso no escudo, simplesmente, quando compro qualquer coisa, o
pão por exemplo, dou por mim a pensar: paguei 1,50 euros, o que
equivale a 300 escudos", disse.
Referiu que outros moradores na
povoação, onde o habitante mais novo tem "mais de 30 anos", têm "maior
dificuldade" do que ela em lidar com a moeda europeia e ainda raciocinam
em escudos.
"Uma senhora, que vai fazer 100 anos em fevereiro,
quando me pede para pagar uma missa, dá-me 15 euros e diz sempre: lá vão
três contos [três mil escudos]", relatou.
A irmã, Maria Miragaia,
66 anos, lembrou que em 01 de janeiro de 2002, ocorreu "uma transição
muito grande", daí que ainda não esteja devidamente adaptada ao euro.
"Quando
as quantias são pequenas, faço as contas certas mas, a partir dos 100
euros, faço confusão. E quando ouço falar em mais de mil euros, nem lhe
digo nada, não consigo fazer a equivalência a escudos", assumiu.
Contou
que os idosos da terra também lhe pedem ajuda "quando tencionam dar
dinheiro a alguém, porque associam que 20 euros são 20 escudos e que 50
euros equivalem a 50 escudos".
"Por vezes, dizem que querem
ofertar três contos aos netos, e eu digo-lhes para darem uma nota de dez
euros e outra de cinco", explicou Maria Miragaia.
Apesar de
assumir que a fase mais difícil de adaptação ao euro "já passou", a
mulher rejeitou "o regresso ao escudo".
"Regressar ao escudo está
fora de hipótese. Seria muito mau para o País", concluiu.
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Sair da moeda única condenaria Portugal "à
mediocridade e à irrelevância" - Oliveira Martins
Portugal deve continuar no euro “por razões políticas”, ou estará
condenado “à mediocridade e à irrelevância”, disse Guilherme d’Oliveira
Martins em entrevista à agência Lusa.
“Precisamos do projeto do
euro, não por razões meramente económicas mas por razões políticas. Caso
contrário, estaremos condenados à periferia, à mediocridade e à
irrelevância”, afirmou Oliveira Martins, ministro das Finanças na altura
da introdução das notas e moedas do euro (2002) e atual presidente do
Tribunal de Contas.
Mesmo tendo em conta a crise financeira que
agora afeta o país, Oliveira Martins considera que valeu a pena para
Portugal integrar a zona euro.
“Julgo que não há dúvidas
relativamente a isso. Basta ver os números, a evolução no que se refere a
grandes tendências de convergência”, diz o antigo ministro das
Finanças. “Creio que estes dez anos são para celebrar.”
Oliveira
Martins prevê que o euro será “duradouro”, apesar das dificuldades
conjunturais e de uma “tendência que pode ocorrer” no sentido da
“progressiva irrelevância” das economias europeias.
“O projeto
do euro não é irreversível, não há nenhum projeto humano que o seja, mas
está para durar”, afirma o presidente do Tribunal de Contas. “Costumo
perguntar aos meus alunos se o euro é uma moeda forte ou fraca; todos me
dizem que é forte. É uma moeda respeitada internacionalmente. Esperemos
que seja a base para uma economia mais segura.”
Oliveira Martins
rejeita igualmente a ideia de que voltar a ter moeda própria poderia
ajudar Portugal a superar a crise económica. Os efeitos positivos da
desvalorização cambial, argumenta, são muito exagerados pelos seus
defensores.
“Essa política das desvalorizações, que muitas vezes
se invoca como espécie de [saída para a crise], não corresponde de modo
algum a uma salvação”, afirma. Optar por essa via “seria apenas aceitar a
periferia e a irrelevância”.
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"Nunca tivemos década tão má" como a do euro, diz
Ferreira do Amaral
A última década foi a pior de que há memória para a economia
portuguesa e o mau desempenho deve-se mais às restrições causadas pela
união monetária que a erros políticos, diz o economista João Ferreira de
Amaral.
Numa entrevista à agência Lusa, Ferreira do Amaral
argumenta que “é razoável” pensar que a Europa “estaria melhor” sem a
moeda única: “A zona euro cresceu pouco, muito menos que na década e
meia anterior. Acumularam-se desequilíbrios gigantescos nas balanças de
pagamentos, nomeadamente em Portugal, na Grécia e também, em parte, em
Espanha.”
Quanto a Portugal, assegura, nunca teve alguma "década
tão má” como a começada com a introdução das notas e moedas de euro em
2002, “pelo menos desde a II guerra mundial”.
Para Ferreira do
Amaral, Portugal “já está” numa situação “pior que há dez anos”: “Não só
pior em termos de rendimento ‘per capita’ como pior nas desigualdades,
pior em termos de estrutura produtiva”.
O economista sugere assim
que Portugal deveria abandonar a moeda única.
“A manutenção na
zona euro vai implicar estarmos décadas a viver à custa de empréstimos
fornecidos pela União. Décadas. Porque não temos condições de
crescimento nenhumas, e o nosso aparelho produtivo continuará talvez
anda mais ineficiente que agora”, afirma Ferreira do Amaral. “Portanto,
de uma ou duas décadas de ajuda ninguém nos tira, numa situação dessas.
Penso que isso é insustentável, mesmo do ponto de vista político.”
O
professor do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG) não
considera que os atuais problemas se devam a erros políticos tanto como
ao “fracasso” do projeto europeu: “Um bom projeto é o que resiste a
erros de política económica. Não me parece, com toda a franqueza, que
tenha havido erros monstruosos de política económica” na zona euro.
“A
nossa questão orçamental é apontada como um grande desregramento, mas
não é verdade, tivemos maior desregramento antes de entrar na zona
euro”, continua Ferreira do Amaral, para quem se o problema fosse o
despesismo dos governos “teríamos um défice muito maior, porque as
receitas cresceram pouco, e a atividade [económica] cresceu pouco.”
Para
Ferreira do Amaral, a “transferência de recursos de setores de bens
transacionáveis para bens não
transacionáveis” é resultado de Portugal
fazer parte de um espaço com uma “moeda forte”.
“O aparelho
produtivo reorientou-se para setores protegidos da concorrência externa,
porque a moeda é forte e não fazia sentido concorrer com produtos
importados”, argumenta. “Isso não foi um erro de política económica, o
erro foi aderir a essa zona [de moeda forte].”
Ferreira do Amaral
também critica a União Europeia por se ter “aberto sem condições” ao
comércio mundial: “A liberdade do comércio é boa em termos gerais”, mas
teria sido preferível “uma gradual liberalização”.
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